Começara a trabalhar, curvado sobre
o arado, quando parou o caminhão e o mandaram subir sem maiores explicações.
Como ele, apertados uns aos outros, com muito medo nos olhos, estavam muitos.
Na primeira parada do caminhão, onde lhes proibiram descer, Paulino perguntou a
um homem que passava para onde estavam sendo levados. A resposta o aliviou e
aos demais: a uma manifestação na capital, porque a revolução havia fracassado.
Aquela que tinha acenado com terra e escola e ferramentas e para a qual Paulino
contribuía mesmo quando não dispunha de dinheiro e se via obrigado a vender uma
ovelha.
Um dia, perguntou pelo título da
terra que lhe haviam prometido. Era preciso ir buscá-lo em La Paz foi a
resposta. Paulino vendeu quatro ovelhas, na capital, dormiu ao relento e no
Ministério lhe disseram que o homem de posse dos papéis assinados pelo
presidente iria logo levá-los.
Os anos passaram e Paulino continuava
a dar dinheiro para a reforma agrária, para a revolução, para o sindicato, para
a cooperativa, para as estradas, mas os títulos das terras não recebeu.
Agora, junto com outros índios,
estava na cidade para a manifestação. Ouviu palavras, em espanhol, que não
entendeu e ninguém discursou em aimará. Caminhou, junto com os outros, pelas
ruas da cidade, carregando uma faixa cujos dizeres ignorava e quando tudo
terminou não achou o caminhão que o levaria de volta.
Chegou em casa no dia seguinte,
depois de andar a noite inteira se enregelando no frio das montanhas e com o
estômago a doer de fome e de sede. Na porta do rancho, a mulher e o filho,
envolto em trapos, o esperavam. Ela perguntou se lhe haviam dado o título das
terras. Antes de cair no sono, respondeu: Ainda
não.
O conto finaliza com essa pequena
frase, absurdamente cruel que, no entanto, guarda uma ilusão. Paulino sofrera,
obedecendo às ordens, nada entendera do que estava acontecendo na cidade e,
abandonado a sua sorte, é obrigado a caminhar distâncias para retornar. Mas, a
palavra ainda que pronuncia, ao
declarar que não recebeu o título que lhe é devido, diz de uma esperança que o
relato, ao mostrar como é enganado pelo que se diz seu dirigente, claramente mostra ser vã.
“El indio Paulino”, publicado em Narradores bolivianos, da Monte Ávila
de Caracas (1969), é um conto de Ricardo Ocampo, nascido em Potosi, em 1928.
Testemunha com ironia e compaixão, o abismo que separa a massa indígena
boliviana daqueles que falam em seu nome na capital do país. Paulino cultiva a
terra que acredita, um dia, será sua. E entre revolução e contra-revolução
continua na miséria, enganado sempre por palavras que mal entende: revolução, reforma agrária. Abstrações com certeza. Porque, quase sempre, no
Continente, elas são usadas, apenas, em proveito de alguns.













