Os versos de William Carlos Williams aparecem,
em epigrafe, no livro, lhe inspiram o título, A serpente na grama (Porto
Alegre, Mercado Aberto, 2001) e, também, num dos poemas A esfinge, em que
Armindo Trevisan, contrariando os que afirmam que a poesia está morta, usa a expressão para defini-la como uma mulher refinada, semelhante à serpente que dá o seu bote na grama.
Essa preocupação com o destino da poesia que, igualmente, expressa em relação
ao romance, também se mostra no poema “Necrológio”
quando indaga Quem disse que a
poesia está morta? e se refere ao poeta grego Yánnis Ritsos e as suas
palavras, pregando o poético (e o doloroso) de uma perna de madeira que deve
preterir o vaso onde as begônias crescem
em sacadas de chalés ao sol. Indagações cujas respostas irrompem no poetar
de Armindo Trevisan que se detém, por vezes, em pequenas coisas, em efêmeros
momentos: na lembrança de Brecht que, doente, se alegra do canto dos melros depois de sua morte. Na visão da moça, vestida de vermelho, sentada sobre a grama /
num campo onde pastavam três vacas
gordas que o inunda de alta e
luminosa doçura. E, nessa inesquecível xícara de café bebida no restaurante da Gare de Amiens, sobrepondo-se às
imagens ofertadas pelo velho
continente: A torre contra o céu, a
fachada radiosa. Esboços breves no desenho de seus versos, construindo a
geografia da emoção. Porque, embora assinale Assis, o Partenon, Chartres e
Laon, espaços bem definidos, o elo que estabelece com eles não se prende à
paisagem nem a monumentos ainda que, de Assis, lembre o azul do céu e não
qualquer um, mas o da Úmbria a remeter aos afrescos de Giotto: do Partenon, as
fustes, as cornijas; de Chartres, os cento e cinqüenta e dois vitrais de sua Catedral,
dois mil metros quadrados de cor e de luz;
de Laon, os blocos de pedra talhada à imagem da Virgem, dos santos, apóstolos e
profetas. Emoção revelada no detalhe, na
relação inesperada com algo de muito simples que, no entanto, se aprofunda em
expressões plenas de significados.
Assim,
se inicia o poema “Assis”,
recomendando olhar o céu para, logo, retornar à ingenuidade da
imagem de um lago, ao pé das vacas;
assim, ao sugerir, já no título, “Ao
pé do Partenon” algo de imponente que se completa na menção a Fídias para
finalizar com a singeleza de beber um
cântaro de água, ouvindo as cigarras; assim, ao se interrogar sobre o que
fazem em Laon os dezesseis bois que pastam
nuvens e granizo. Ou por que tantos operários (de tão variadas
nacionalidades) esqueceram os próprios
nomes, pois apenas um registrou o seu em Rouen. Porém suas perguntas – ao
leitor ou a si mesmo? – e o mistério de alguns versos conduzem a um universo
mais denso. Porque lembram enigmas esses versos: Em Assis as próprias pedras têm remorsos,
/ e a alegria do vento é a de um cavalo que escoiceia, Ao pé do Partenon, em silêncio
meditas / volumes musicais, fustes, cornijas,/e te embalas com a imóvel dança
dos cavalos. Em Laon, as pedras
sempre serão pedras, Ferozes pedras, / exibindo
ao sol suas nudez paleolítica.
Enigmas que a magia do poeta transforma em janelas de ver o mundo.
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