domingo, 3 de janeiro de 1999

A explicação

          Conhecido como Magón, Manuel González Zeledón nasceu na Costa Rica em 1864. Viveu setenta e dois anos, trinta dos quais nos Estados Unidos, como diplomata, o que torna admirável a sua obra feita, essencialmente, de quadros de costumes de seu país.

         “El clis del sol”, publicado na antologia organizada por Seymour Menton, El  cuento hispanoamericano (México, 1964), é um valioso exemplo tanto no que se refere ao linguajar espontâneo do povo como no perfil que desenha que é o da mais acabada e perfeita ingenuidade.

           O narrador é Magón. Relata a conversa que teve com seu amigo Cornelio Cacheda que lhe chegou de visita, trazendo com ele duas meninas pequenas. Loiras como espigas, brancas e rosadas como pêssego maduro, as gêmeas contrastavam, fortemente, com a figura do pai, moreno, tosco, feio, de traços fisionômicos irregulares.

            Admirado, Magón pergunta se a mulher dele era loira, se havia antepassados loiros na família. Em resposta, ouviu uma estrepitosa gargalhada de desdém pois Cornelio Cacheda não podia entender como, um homem letrado e lido soubesse menos do que ele, um  peão campeiro. Magón pede explicações. Primeiro, ouviu, longamente, como as meninas recebiam presentes e regalias de todos por sua beleza. Depois, conseguindo que o pai voltasse ao assunto, escutou que tinham nascido assim, clarinhas, porque a mãe tinha espiado a eclipse do sol. É a vez de Magón se admirar de vê-lo chegar a essa conclusão. Para, então, escutá-lo confessar que, na verdade, não fora ele quem adivinhara a razão do acontecido, mas que tudo lhe fora explicado pelo mestre italiano, aquele que construíra a torre da igreja da cidade: um homem claro, de cabelo vermelho, muito branco e maciço que, há quatro anos, comia na sua casa.

            Só então, se percebe o sentido de seu nome, que em nenhum momento deixa de ser levado a sério pelo amigo que o escuta. Magón não apenas se abstém de julgar os fatos, mas se propõe a analisar, com seriedade, o assunto e dar uma opinião depois de ouvir a de seus leitores.

            Fica evidente que entre o letrado e o rústico amigo, com quem conversa, não há hierarquias culturais e a ingenuidade de que dá provas Cornelio é comum a ambos. Compete ao leitor entender, pela última linha do conto – Pois foi ele quem me explicou a coisa da eclipse do sol – o que permanece subentendido, já que nenhum dos personagens tem condições de perceber o quê de fato acontecera, devido à confiança que depositam: Cornelio, no que diz o homem que lhe freqüenta assiduamente a casa; Magón, no que lhe explica o seu amigo.
 
           O relato, conciso, se faz sozinho no diálogo entre aquele que narra e aquele que o irá reproduzir, guardando uma unidade que frase alguma ou qualquer elemento estranho possam interferir. E o desenlace, imprevisto, está em acorde com tudo o que foi dito antes. E com algo de picardia poist a vida, neste conto, é mostrada como, eventualmente, ela pode ser: sem dramas ou tragédias a subscreverem infrações de normas. Quando ninguém delas tenha se dado conta.

                                                                                               

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