domingo, 1 de julho de 1990

Poemas de amor e de guerra

            Cinco poemas formam o primeiro livro de Idea Vilariño publicado em 1945.Uma linguagem pródiga, rica de imagens, diz Mario Benedetti, início de um atormentado processo criador ao qual se acrescentam poemas que expressam uma visão de mundo desolada, sincera, patética, construída a partir de amores e de perdas.

            Desencontros de vida a dois que no compartilhar da mesa e do leito se movem na solidão. Posses que se diluem em ausências. Dores que se prolongam escurecendo os versos. Assim vão se fazendo os poemas de Cielo cielo (1947), Paraiso perdido (1949), Por aire sucio (1951), Nocturnos (1955), Poemas de amor ( 1958), Pobre mundo (1996), No (1980).


            No ano passado, La Casa de las Américas publicou Nocturnos del pobre amor, título que reúne palavras de seus outros livros, uma antologia em que a seleção de Yoel Mesa Falcón reuniu o que se considera o melhor de sua obra. Ordenada apenas com o intuito de fazer com que o leitor compartilhe da beleza contida nesses versos que, sem dúvida, se situam entre o melhor já produzido no Continente. E, embora sem que  algum dado  identifique trajetórias, muitos dos poemas mostram que a mulher amorosa e sofrida soube, também, cantar  outros amores e sofrimentos que não somente os seus.

            Assim, os sofrimentos daqueles que reclamam o que é seu / ou que procuram ser apenas homens; dos que são vítimas da injustiça, da opressão,  do abandono, da fome, do frio, do medo, da exploração, da morte. Ou, sintetizado num destino individual, a tragédia dos torturados, dos que, desejando abraçar uma causa, são, por isso, destruídos:  José Varona, morto,  René Zavaleta, morto. A dor e miséria em cada espaço: sujando o planeta / e respirando junto com o ar / os uivos de meia humanidade. Então, a voz feminina prega a guerra: Se nunca haverá paz / se o abrigatório, o único decente/ o que pode nos limpar a consciência / é sair matando / limpar o mundo.

            Mas, expressão de incredulidade e de esperança  é o seu poema “Digo que no murió”. Sentimentos que uniram tantos e tantos quando, no mundo,  irrompeu a voz dizendo da morte do Chê.  Como criança que não acredita na sua desgraça e afirma e reafirma uma  certeza contra todas as evidências, os versos repetem a negativa: Digo que no murió. Procuram justificativas:deram-no por morto repetidas vezes, não morreria tendo tanto por fazer, não se iria deixar apanhar facilmente. Porém, deve se curvar à evidência e na expressão final do poema, adulta e lúcida, Idea Vilariño, nascida em Montevidéu, em 1920, pede que amigos e irmãos não se esqueçam dessa mão vendida,  dessa bota suja e norte-americana / mostrando a ferida com desprezo, do coração mais sujo que essa bota, que não esqueçam nem o nome, nem a cara desse tenente Prado.

 Porque a esperança  persiste como um consolo. Embora inscrita no impossível:   ainda chegará um dia, chegará uma hora.

           

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