O
desengano é uma das expressões da lírica de Alfosina Storni. Pretender assumir
a maternidade sem ter se submetido às leis às quais ela deve estar submissa ou
pretender gozar dos direitos, até então, reservado somente aos homens foi um
avançar sobre o seu tempo que, necessariamente, teve um preço. E, os versos da
poetisa argentina, muitas vezes, traduzem as decepções e as revoltas que tiveram
o seu germe num meio e numa época em que ser livre para o amor e para ser mãe fugia aos padrões e a seus
consentimentos.
Sofrer
muito, porém, não foi razão suficiente para que Alfonsina Sorni se negasse ao
amor, para que deixasse de ansiar por ele. E, sua entrega já se inicia na
espera do amado. Uma espera que é ritual ( o poema “Sábado”o descreve) em que se mesclam desejos primitivos de
sentir a terra, a água, as plantas, os animais ( andei descalça...beijei as plantas... perfumei as mãos com o sumo cheiroso do jasmim) com os ecos de um conforto traduzido em som
de louças e cristais, em visões de
mármore branco. Perfeição e beleza que a poetisa aspira para seu corpo: ser
deusa feita de mármore, com cabelos de fios entrelaçados, com a boca de flores.
Em
1952, quatorze anos depois de sua morte, nascia em Cuba, Reina Maria Rodriguez.
Cresceu para se fazer poetisa num momento em que já estavam sendo ofertados à
mulher outros caminhos: a realização profissional irrestrita e o direito de
aspirar, sem pretender liames formais, à plena realização afetiva. Reina Maria
Rodriguez procura, também, o amor, o amado. Talvez, mais do que tudo, o
verdadeiro encontro com o outro.E, o leve desencanto que perpassa nos seus
poemas provém, não de abandonos ou decepções, mas da impossibilidade sua e da
impossibilidade do amado de se compreenderem: insetos transparentes que não souberam voar até a perfeição. Sabe
que seu corpo se cala porque está, ainda, preso a rigores herdados. Mas, à
espera do amado não pensa em oferendas. A seu encontro leva, apenas, o medo de
esperar em vão. E, quando se quer perfeita, é um dizer irônico enumerando seus
defeitos ( ter gostos desordenados, apreciar exageradamente o café, sofrer, como qualquer mortal de doenças
crônicas) e seus inconcebíveis desejos: dispor de objetos extraordinários,
aprender alguma coisa ou dizer como é o mundo, possuir um tigre de verdade ou,
por uns instantes, ser mis universo.
Esperar
pelo amado ou para ele desejar ser perfeita são momentos que aproximam,
brevemente, essas duas poetisas entre si tão distantes. O tempo que transcorreu e as transformações que
trouxe para o ser feminino, certamente,
não modificaram os seus anseios.
Mas, permitiram que esses anseios não
continuassem presos a conceitos, a
estereótipos e a leis e pudessem, então,
ser expressos livremente, sem
entraves.
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