É
uma vasta galeria de personagens que vai se apresentando ao longo da narrativa.
A não ser, a principal, o louco do Cati, cuja designação dá nome à obra (O Louco do Cati, Porto Alegre, Globo,
1942), todas tem – ou mais, ou menos – uma presença passageira. Talvez o que
Henri James chame de fio: aparecem
somente para assumir uma função no enquadramento causal das ações. Nesta obra de Dyonélio Machado,
são personagens que se revelam por escassos dados a respeito de seu físico, por
um gesto, pela expressão de um sentimento, por um diálogo em que predominam as
zonas de sombra. Raras vezes, há menção ao que vestem. E, quando tal acontece
é, apenas, uma breve referência: algo para determiná-lo tenha ele uma efêmera
presença ou possua um imprescindível desígnio narrativo. Algum detalhe do
vestir: estar em mangas de camisa como o homem que vendia gasolina
na beira da estrada: emponchados,
agasalhados, como alguns em Santa Maria de noite chuvosa e ruas desertas
entravam no café; usar calção de banho como Norberto ao chegar no mar; viajar
de calção com o casaco de pijama por cima como seus companheiros de viagem.
Com
mais algum detalhe, a referência ao traje de um personagem-figurante: o sujeito
baixo, as pernas finas, calçadas com
quilote branca que sobressaía muito da cor escura das botas altas; o rapaz
que viajou de avião com os demais e não tinha
nenhum agasalho de inverno sobre a
roupa barata; o praieiro, um homem de
bombacha estreita (parecia calça de guri) em mangas de camisa, chapéu de palha; o coronel que trajava quilote, perneiras, casaco de couro com fecho eclér e levava com ele,
fazendo questão de carregar, uma capa gris: era à prova d’água e ele sempre a
usava nos trabalhos do campo, nas
viajadas a cavalo. Ao descerem todos do avião e se dirigirem para a casa da
fazenda, o vento irá abri-la, como, também, a do comandante Amilívio que era
preta com botões dourados. Dava-lhe, na tarde cinzenta, um
aspecto lendário..., levando o
louco do Cati, assustado, a fugir em disparada o quê foi decisivo no desenrolar
da narrativa.Menos inocentes, outras menções de Dyonélio Machado ao que vestem seus personagens. O delegado, atendendo as partes, era pessoa de grande importância. Trajava roupa leve. Face pálida (moreno pálido). Todo ele muito bem cuidado, muito distinto. Um anel de bacharel na mão bonita, bem tratada. E policiais fardados acompanhavam Norberto e o louco do Cati, presos, na viagem para Florianópolis; seus companheiros de cela, no Rio de Janeiro, vestiam só calção e tamancos ou casaco de pijama e calção.
No
entanto, é no capítulo “O Professor da Universidade” que a menção à roupa
adquire, no entrelaçamento com outras expressões, um significado não mais
irônico ou trocista porém, tristemente mordaz e crítico. Num anfiteatro, o
professor Castel e seus assistentes, semanalmente, davam consulta geral,
assistida pelo corpo clínico, sempre numeroso. Diante de todos e com a porta
aberta, o doente se despia. Às vezes,
pessoas da família do paciente – invariavelmente de pé, afastadas, a face
triste, as mãos ocupadas com as peças de roupa que ele ia despindo e não atinando onde largar. O diagnóstico era
dado, os interessados reviam suas anotações e o doente tornava a vestir-se,
ali, diante de todos.

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