Revolução
picaresca, assim chama Fialho d’Almeida a instalação da República no Brasil
ao iniciar o seu texto, depois reunido, como os demais que escreveu sob a
rubrica Os Gatos, em cinco volumes,
publicados pela Livraria Clássica Editora de Lisboa. Na sua matéria jornalística,
ele comenta a chegada do Imperador D.Pedro II, recambiado para a Europa onde desembarcou em Lisboa. Desembarque em
que encontrou, segundo Fialho d’ Almeida, as
caras de cortiça do séqüito do snr. D. Carlos, e a refilante matilha de
repórteres, ávida de conspurcar a majestade do infortúnio com a inexprimível
solércia das interviews, obscenizada por essa absoluta falta de pudor dos que
fazem da alcovitice um ganha pão.
Ainda que, em certo momento, afirme sentir uma
ponta de ternura pelos dois
nobilíssimos velhos destronados, o desprezo que sente pelo jornalismo miúdo que prospera nas
reportagens que acompanharam os dez primeiros dias do Imperador na cidade o
leva a imaginar uma estapafúrdia entrevista que, ao se propor ridicularizar o
entrevistador, torna também, o entrevistado um personagem burlesco e ridículo.
Primeiro, ao dar a mão molemente ao homenzinho,
com a resignada bondade de que, há muito se entretém, como Esopo, a fazer falar
os animais. Logo, a se antecipar às perguntas, respondendo sobre o cardápio
de seu jantar e sobre as suas intimidades higiênicas. O que levou o entrevisteiro a farejar algo de novo, a influência da roupa branca na queda das
dinastias e ao ensejo de formular
perguntas e respostas de um mau gosto desolador. Antes disso, menciona a quase
inexistente presença da colônia brasileira, constrangida e desdenhosa, para
recepcioná-lo na chegada. Porque uma possível simpatia por D. Pedro II não
tinha mais sentido, pois, exaustorado, já não daria pensões a artistas e
estudantes, nem nomearia cônsules ou plenipotenciários e nem brasileiros, nem
portugueses abrasileirados podiam, então,
pretender auferir vanglória ou espórtula
de vulto!. O que, no entanto, não irá impedir o entrevisteiro, antes de formular a derradeira pergunta – uma
restauração será possível? – de pedir dez tostões emprestados. Ao que D. Pedro
II, nesse diálogo imaginado, responde: Ai
de mim! Reaver o império é quase tão impossível como reaver os dez tostões. Na verdade, o esboço de um
perfil caricatural de D. Pedro II que, pouco tempo antes, Fialho d’Almeida
definira, em outro artigo, como figura
venerável. Assim, embora, alguma vez, pudesse mostrar simpatia pela figura
de D. Pedro II, o registro feito de sua
chegada a Portugal parece ser, apenas, uma oportunidade a mais para achincalhar
a monarquia. E o faz com o ímpeto verbal que lhe é particular em que a
mediocridade se faz presente tanto quanto as expressões estilísticas e as
construções inventivas que o situam entre os grandes escritores portugueses de
sua época.

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