
Em
1990, a Arca de Montevidéu publicou uma antologia poética de Mario Benedetti
cujos poemas, parte de treze de seus livros, se inscrevem entre 1948 e 1981.
Longo itinerário de uma aventura literária que expressa os percalços de sua
vida, oriundos das opções políticas condenadas pelos desgovernos reinantes nos
países latino-americanos, os chamados do amor, o olhar testemunho.
De
seu livro Cotidianas (1978-1979),
“De árbol en árbol”( “De árvore em árvore”) é um poema de sete estrofes
díspares – dois, três, quatro, cinco, seis, oito versos – que se mostra colmado
de perguntas ingênuas, fantasiosas, que dir-se-iam irrespondíveis não fosse um
chamado à realidade, o penúltimo verso, a
serra das grandes madeireiras, certamente,
razão primeira do poema. Nele, versos pressupõem possíveis sentimentos humanos
nas árvores: As árvores / serão, talvez,
solidárias?”Nesse caso, elas podem se preocupar com outras, ainda que não
da mesma espécie, como consta na terceira estrofe em que o carvalho da
Westfália, que sabe, avisará o lariço do Tirol para que administre melhor sua
terebentina; ou, eventar a hipótese de que a seringueira do Pará e o Baobá das
margens do rio Cuanza, provocarão, finalmente, o fim da grande angústia / daquele cipreste
da mission Dolores
em Frisco, na Califórnia; ou outra, se os cedros do Líbano e os mognos de
Corinto terão consciência de que seus inimigos não são as palmeira de Camaguey,
nem os eucaliptos da Tasmânia mas elementos estranhos que estão a serviço dos
homens ou aqueles inevitáveis que vem da própria natureza. Tais espécies
distintas – também se refere ao quebracho, à oliveira, ao umbu, à ceiba, ao
agárico – e próprias de regiões geográficas longínquas entre si, não deixam, igualmente, de estarem a mercê de
um destino comum: o machado do lenhador
e a cobiça sem fim e sem consciência dos que vivem da exploração das riquezas
naturais.
O
poema, de versos brancos ignora, exceção daquela que inicia o primeiro verso,
todas as maiúsculas o que, no que se
refere aos topônimos, torna o texto marcado com algo de mistério. Porque, se
alguns remetem a lugares conhecidos - Campos Elíseos , Tirol, Pará, Corinto, Líbano
– outros somente são conhecidos de uns poucos: Jaén ( cidade da Espanha),
Tacuarembó ( cidade uruguaia), Cuanza ( rio de Luanda), Frisco ( cidade da
Califórnia), Camaguey ( Cuba), Tasmânia ( Austrália).
Num
ritmo e tom de dizer prosaico, o lirismo
se encontra, então, somente na antropomorfização das árvores e só no que o
homem possui de elogiável : a solidariedade, a disposição em ajudar e, talvez,
essa ingenuidade que o torna incapaz de perceber de onde provém o Mal. Para as
árvores, Mario Benedetti não tergiversa: seus vorazes inimigos – quão fácil é localizá-los nesse mundo globalizado onde fronteiras se diluem diante
da possibilidade de lucro – são aqueles que usam das serras e dos machados.
Eventualmente, também natureza pode ser cruel no seu raio a se mostrar como um látigo da noite.

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