domingo, 9 de setembro de 2007

O começo


       
                 Era o ano de 1550 quando, a mando do padre La Gasca,Vice-rei do Peru, saíram  de Lima, duzentos espanhóis com seus índios submetidos e um punhado de animais para se adentrar no Continente e fundar uma cidade. Carlos Droguett, romancista chileno, relata esse episódio que se encontra documentado nas Crónica de la Conquista num excepcional romance, El hombre que trasladaba las ciudades ( Noguer, Barcelona, 1975). Ambições, ódios, temores, conduzem os homens para o desconhecido. Junto com eles, o começo da destruição do Continente. No segundo capítulo, “Segundo traslado”, são mencionadas as árvores e seu destino O padre Cedrón, ao se afastar dos escombros da cidade destruída, para ser levada para outro sítio, caminha na direção dos cerros onde ainda estava o campo sozinho, as árvores sozinhas e terríveis, crescendo em desordem e poderosas. Por vezes, elas são  parte do cenário: Os cerros estavam envoltos na penumbra, além das árvores se destacavam as sombras de uns cavalos; das árvores pendiam laranjas, limões pálidos que fugiam na penumbra, as flores ascendiam pelos troncos. Ou, transformadas pelo vento e pela chuva: o vento rumorejava distante, entre as árvores, o céu estava alto e descolorido, se peneirava sobre as árvores e as agitava docemente, soprava com persistência entre as copas das árvores, alto e primaveril, incorporando e levando perfumes e ramos das árvores.  A chuva escorrendo da copa das árvores e de seus ramos, ia lhe deixando gotas de água. Também, se constitui presença junto aos homens: o padre Carvajal acorda e escuta o rumor  de água a escorrer vagarosa e do vento entre as árvores, o ar entre as árvores, descendo entre as folhas. O capitão sente a chuva encharcar-lhe o rosto e como corre pelos ramos das árvores.  Os espanhóis, percebem o cheiro das árvores molhadas  e, também,  como agarrados ao futuro, às portas da cidade que estava longe, aguardando com suas casas abertas, com seus quartos vazios, cheios de montanhas e rios e cascata,   a praça estava rodeada de enormes árvores verdes. Sob o olhar  do capitão, avistadas de sua janela, as casas estão envolvidas pela luz do anoitecer como suas ruas e  a praça da igreja que se erguia, outra vez, cheia de árvores novas. Em meio às ovelhas e cabras, correndo entre  os móveis espalhados, as árvores cresciam com renovada força, espantosamente verdes e frondosas.  Uma luta que se mostraria desigual porque o ímpeto de sobreviver que as fazia irromper, novamente da terra, para se tornar frondosas, se revela muito lenta ou ineficaz  diante da força destruidora de que são vítimas.  O padre Cedrón vindo da primeira cidade onde ficara para enterrar os mortos, chega na segunda cidade  já, também, semi-destruída ao ver   o padre Carvajal extenuado e doente lhe pergunta: padre, quem o havia metido na vida sossegada da religião e depois na vida mortificada  e aventureira dos missionários meio bandidos e sem entranhas que tinham saído para o Novo Mundo junto com a piara de   bandidos que talavam os bosques, rompiam montanhas, fendiam  a terra e matavam os índios ?

 

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