Ponciano
de Azeredo Furtado começa por dizer que é coronel
de patente. E vai contanto a vida que teve de menino rico a crescer sem
muitos sustos e dos sustos fugir. Enreda-se em aventuras e amorios e vai
desvelando sua alma e seu viver nos campos de um Brasil que parece inventado,
numa estrutura ficcional presa, minuciosamente, a um correr do tempo marcador
de ações e sentimentos. Muitas vezes, faz menção à semana, em referências que
indicam – a não ser um par de semanas,
semana toda, semana depois – uma indeterminação temporal: pelo correr da semana, volto
numa semana, no decorrer da semana. Indeterminação que não se desfaz
com as expressões que lhe conferem um limite: todo rabo de semana os rabos
de semana, no oco da semana, no fim da semana, o resto da semana, no arredondar da segunda semana, no morrer da segunda semana. E nem se
verifica, maiormente, no uso da expressão quinzena.
Salvo em três casos, há mais de uma quinzena, uma quinzena não era passada, nem
uma quinzena era passada, indica uma passagem de tempo exata: safadeza de uma quinzena, quinzena de vadiagem, quinzena de buscas, quinzena bem contada,
uma quinzena vencida, por tempo de uma quinzena, no corpo
de uma quinzena. Também aparece como referência em relação a um tempo
anterior (uma quinzena de menos, uma quinzena antes da eleição) ou a um
tempo posterior (uma quinzena mais adiante, passou uma quinzena e mais outra dobrou a
esquina) .
Tanto
as referências à semana, como à quinzena, curiosamente, contrariam as demais
notações de tempo que se relacionam a fenômenos da natureza, a acontecimentos
sociais, a animais, à estações, a sentimentos, sempre ricas de sugestões. Como
se o registro dessa duração de tempo transcorrido, encerrado em sete ou quinze
dias, tivesse, apenas, como função precípua destacar as traições, as perfídias,
os ódios, os desabafos, as promessas, as esperanças, os receios, as privações,
as amizades, os prazeres, as desavenças, os contentamentos que pontilham a vida
do Coronel.
Eludindo
os termos semana e quinzena, aparecem as seqüências meio mês não era decorrido, meio mês. Medida
de tempo que, também, profusamente, indicará sua duração convencional ou de um
prolongar indefinido: com o passar dos
meses, com o andar dos meses. Porém, no dizer do Coronel, por
vezes, se acrescentam a essas medidas, informações que o mostram conhecedor das
mudanças trazidas pelo passar do tempo no seu universo: mês de inhambu, mês de
cigarra, mês de lua grossa; ou, a
elas sensível: De tarde, debruçado na varanda, vi chegar o roxo das
quaresmeiras. Peguei um susto. Abril levantava asa. Um exemplo do que, no relato, as noções de tempo além de
funcionarem também como suas linhas condutoras fazem emergir preciosos achados
estilísticos. Certamente, imbuídos de insubstituíveis elementos para a
composição do personagem narrador nas suas vivências reais ou inventadas. Tão
magníficas, na escrita de José Cândido de Carvalho que Raquel de Queiroz na
reedição de O Coronel e o lobisomem
confessou que se não fosse uma velha senhora e ele, tão mais jovem, até lhe tomava a bênção, de tanto o admirar.
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