Cristóvão
Colombo passou meses implorando ajuda, incapaz de desistir do sonho de conhecer
o fascinante universo que apenas entrevira na sua primeira viagem à América e
abriu o caminho da violência: em troca do frete dos navios e mercadorias oferecia
um carregamento de escravos. A primeira ilha descoberta foi, então, vítima dos
colonos ali deixados. Matanças como represália ou por prazer a despovoaram em
menos de dez anos. La Española, hoje o Haiti e São Domingos e, depois, Cuba, em
1508, foram o cenário onde os europeus aprenderam a fazer dos índios animais
domésticos e onde cometeram, na luta entre si mesmos, o perjúrio, o homicídio,
o roubo. Em La Española foi legalizada a venda de seres humanos, início de um
interminável período de atrocidades que a arqueóloga Laurette Sejourné
documenta em América Latina: antiguas
culturas precolombianas (Madrid, Siglo XXI, 1971). As costas da Venezuela e
Colômbia e das ilhas vizinhas, passarão a ser provedoras do gado humano que, no México, os europeus não cessavam de exterminar.
No Panamá, Vasco Núñez de Balboa, com suas armas de fogo, seus punhais e seus
cães, pilhou riquezas, escravizou e exterminou índios. Em Cuba, para não
sofrerem as atrocidades dos conquistadores que, na sua fúria pela posse do ouro
não tinham limites, os índios – exauridos no trabalho, sem receber alimento,
mutilados, assassinados – muitas vezes, optavam
pelo suicídio. Nos relatos de Hernán Cortez a Carlos V, a matança sistemática
de um assombroso número de índios é enaltecido: lutávamos por nossa fé e a serviço de vossa sagrada majestade. [...]
Deus nos deu tanta vitória que matamos muita gente, sem que os nossos recebessem danos. Seu proceder, dito
guerreiro – ataques ao amanhecer,
incêndios dos povoados indígenas, morte de mulheres e crianças – foram os
mesmos usados pelos demais conquistadores. No Equador, queimados vivos os
chefes indígenas e os demais índios torturados e marcados com ferro. O ouro
achando-se em poder dos habitantes do Continente, determinou duas medidas ao redor das quais se
cristalizou o mecanismo prático e ideológico
da conquista por parte dos monarcas espanhóis. Primeiro, que a finalidade
da conquista era econômica e que, portanto, a aproximação com os autóctones
poderia ser recusada; segundo, a determinação de uma arenga, um Requerimento para explicar aos indígenas a grandeza dos
soberanos espanhóis, do Papa, da fé, em nome da qual lhes proporcionariam ajuda
e que se recusassem a submissão seriam capturados.
Teoricamente, o documento deveria ser lido (numa língua que os indígenas não
conheciam) antes do começo das hostilidades o que nem sempre acontecia. Mas, a
partir dele, a inegável legalização da rapina: se não houver submissão à Igreja
e ao rei da Espanha, uma guerra sem trégua, por todas as partes e de todas as
maneiras; a escravidão, inclusive das mulheres e das crianças e o direito de
vendê-las; expropriação de todos os bens e razão para causar todos os males e
danos possíveis.
De
fato, concluiu a arqueóloga francesa, tal Requerimento se constitui a estrutura
moral que os monarcas divinos e terrestres deram à invasão: a essência divina
da conquista.

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