Se
os viajantes que chegaram a Porto Alegre e deixaram suas impressões em cartas,
diários, informes, tiveram, sempre, muito a dizer sobre a sua localização,
sobre o cenário descortinado a seu redor e, também, sobre algumas de suas
características como cidade, ou por terem permanecido apenas alguns dias e/ou
somente na condição de forasteiros, o que puderam dizer a respeito de seus habitantes
foi bastante escasso. Breves e parcas observações, disseminadas nos testemunhos
compilados por Valter Antonio Noal Filho e Sérgio da Costa Franco e publicados
no final de 2004, em Santa Maria, pela Editora Anaterra , em Os viajantes
olham Porto Alegre 1754 – 1890 e Os viajantes olham Porto Alegre
1890-1941. Certamente e, não poucas vezes, mostrando o acerto desse título,
a cidade se oferece, apenas, ao olhar. Um exemplo, as palavras de um viajante
que, em 1885, dizia ter tido pouca oportunidade de ver (é o verbo que emprega) a
elite da cidade em grandes grupos e em número considerável. Repete o verbo para acrescentar que o que
vira apresentava uma tintura de decorosa
elegância e de distinto europeísmo e, outra vez, ainda, para fazer o elogio
das moças, de boa aparência, bonitas,
alegres que pudera ver aqui e ali ou
quando assomavam à janela. São os costumes das senhoras de Porto Alegre, tanto
quanto pode ver e julgar um viajante em poucos dias. Cinqüenta anos antes,
um outro dissera que penetrar no que chama de santuário misterioso só era possível quando a severidade do marido
diminuía diante da boa conduta do estrangeiro a demonstrar que não representava
perigo para a sua família e lhe abria as portas, um favor que exigia em troca
reserva e circunspecção. Assim, as referências que aparecem às pessoas da
cidade, no primeiro volume, em grande parte, se devem, apenas, ao que se mostra
mais evidente. Um viajante observa a mistura
de raças, nacionalidades e cores de pele que, de acordo com outro, ambos escrevendo na mesma época, pode
variar desde o branco como a neve até preto profundo. O que é, igualmente,
mencionado por um terceiro ao notar que a aglomeração de gente no mercado,
formando uma mistura colorida de pessoas,
permitia perceber desde o preto-ébano
mais reluzente de gordura, todos os matizes do marrom e do amarelo até o lindo
branco com um halo rosado, todos os
tipos de pele estão representados. Tais comentários sobre a cor da pele não
serão, no entanto, muito freqüentes. Destaca-se o de Auguste de Saint-Hilaire,
que se refere aos homens de Porto Alegre como grandes, belos, robustos, tendo a maior parte o rosto corada e os cabelos castanhos. Uma opinião que irá
reiterar mais adiante: muito claros e de
cabelos e olhos semelhantes, na cor,
aos das mulheres, eram grandes e bem feitos; das mulheres que encontrou num
pequeno baile, ao qual fora levado por um compatriota, diz que eram muito brancas, de cabelos castanhos e olhos pretos.

Uma
observação sobre o nariz dos homens, muito
longo e fino; outra, sobre mulheres
maduras, com aparência de barris e homens com pernas arqueadas; sobre a
presença de uma jovem e linda moça e de encantadores rostos de mulheres, já de per si pouco visíveis, as quais,
comparáveis a uma verdadeira mostra de beleza, enfeitam as janelas e os balcões;
sobre mulheres joviais, bonitas,
amáveis... e até graciosas, mostram traços que irão se completar com as
notas sobre a sua maneira feminina de se vestir e de se comportar. Também,
muito rápidas, dizem ou que as mulheres se vestiam com simplicidade e decência,
ou, em festas, se sobrecarregavam de flores, de bugigangas, usavam vestidos de cetim branco bordado e
empalhetado de ouro e prata, sapatos e luvas de cetim e muita jóia. E que,
embora seguissem, como os homens, a moda francesa, dela não estão ausentes os
acertos locais: cores berrantes e os
desenhos bizarros. Na quinta-feira
santa, vão à igreja com roupas
resplandecentes, deixando à vista os ombros e os braços e com a cabeça descoberta, parecem prontas para o baile. Sentadas no chão e até de
costas para o altar, conversam e riem e comem doces. Como no teatro ou nos
passeios pela rua principal da cidade, se deixam admirar nas suas roupas novas.
Os bailes são raros e morosos. E elas se divertem, espiando pela rótula, a
zombar dos passantes.
Ainda
que recebam críticas ferrenhas sobre a sua maneira de ser, uma e outra vez,
como também, sem contemplações, as recebem os homens, uma e outra vez, três mulheres
porto-alegrenses tem seus nomes mencionados por prodigarem gentilezas inerentes
à hospitalidade. Uma virtude tida por um raro costume de franqueza e
generosidade, que torna grato a um dos viajantes e leva outro a dizer que ela é
exercida com tato e com delicadeza, procurando tornar o país agradável aos
estrangeiros. E a boa hospitalidade,
considera um outro viajante, é a única qualidade dos rio-grandenses.
Os
olhares são muitos e diversos. Admirativos, preconceituosos, sóbrios. Por
vezes, levados pelo entusiasmo, ou pela mordacidade, têm um viés exagerado ou
errôneo.
Agora,
as palavras que os expressam, no resultado do magnífico trabalho de Valter
Antonio Noal Filho e de Sérgio da Costa Franco, podem ser conhecidos e
apreciados num itinerário muito rico e prazeroso, pleno de qualidades,
constituindo-se uma fonte preciosa para estudos sobre a história de Porto
Alegre.
Nenhum comentário:
Postar um comentário