domingo, 8 de agosto de 2004

O Poeta perguntador: Crepusculário


            Pablo Neruda tinha dezenove anos quando publicou seu primeiro livro, Crepusculário. Da emoção de ver seus versos impressos, ele irá contar no capítulo segundo de “Las vidas del Poeta. Recuerdos y memórias”que escreveu para a revista O CRUZEIRO Internacional, em 1962  Livro  ingênuo e sem valor literário, diria, anos depois a Alfredo Cardona Peña que registrou esse testemunho na revista Cuadernos americanos (dezembro de 1950).  No entanto, essa edição, vendida por quinhentos pesos o que, na época, equivalia a menos de cinco dólares e ilustrada por Juan Gandolfo, foi recebida com aplausos pela crítica. Prudente, Pablo Neruda reconhecia, no primeiro poema do livro que a sua voz se erguia em rosas trêmulas,   nem pomposas, nem fragrantes. As primeiras  de seu desconsolado jardim adolescente.  Modéstia em que se entrelaçam a idéia das primícias e o reconhecer-se jovem e triste, revelando como que um pedido de compreensão, dirigido a um irmão caminhante. Interlocutor que o Poeta imagina seu semelhante nessa busca que empreende como, também a mulher (carne e sonho, a menina, a camponesa), a rmã, o pai, o irmão de alma, o amigo, os amigos,   alguém indeterminado, o amor,   ele mesmo, o velho cego, as ponte, o ferro,  o vento do mar , a infelicidade,  Deus. Dirá  de suas inquietações  e perplexidades diante da vida; de sua melancolia frente ao passar do tempo; de suas ânsias e devaneios amorosos;. de sua visão de mundo e preocupação com os seres inanimados; de  seus laços afetivos com o pai e com a irmã, de sua ligação solidária com os assim denominados amigos; de sua admiração pelo que Deus criou. E, muitas vezes, os interpela . Um recurso  - fazer perguntas, dirigir-se a alguém - que irá conservar ao longo dos anos, expressão de seu desejo de  compartilhar  com os demais o que lhe vai na alma. Incertezas e  melancolias próprias dos primeiros anos às quais se acrescem aquelas da criança privada de sua  mãe e  que se sente, irremediavelmente, abandonado, pontilham os poemas de Crepusculario. O Poeta as enuncia  a si mesmo (Para que dizer a canção / de um coração que é tão pequeno?, Que eu com os olhos quebrados sigo um caminho sem fim / Por que dos pensamentos, por que da vida em vão?, Vai-se a poesia das coisas / ou não a pode condensar a vida?); ou, se projetando no outro ([...]cego, que espera da dor?, [...] que podes esperar ?, cego, sempre será teu ontem amanhã?, Aonde vais agora?.Ou, ainda, dividindo a desesperança ( Homens de coração ingênuo / O que mais podemos esperar?). Antropomorfizando as pontes, lastima-lhes o destino de permanecer imóveis quando as paisagens, a vida, o sol, a terra, seguem a viagem sem fim. E as perguntas a elas dirigidas, que o termo maldição introduz, são, na verdade, aquelas que o espanto de viver – e ter consciência de que tudo é transitório  - origina. Alguma vez procura respostas, como no poema “Saudade”, em que busca o significado da palavra, estranha ao espanhol, em dicionários empoeirados e antigos / e em outros livros,  em que pergunta a alguém que, também, a ignora.

E,  se entre as perguntas, existe aquela que jamais será respondida ( Deus – de onde tiraste para acender o céu / este maravilhoso crepúsculo  de cobre?),   outras há, enigmáticas, recônditas, fascinantes  que somente o engenho e arte de um outro poeta poderá responder.

 

             

 

 

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