domingo, 25 de abril de 2004

De perigos e cautelas


            Estudou teologia em Nova Iorque e voltou ao Brasil com o título de Mestre. Denunciado como subversivo, em 1968, para fugir das ameaças que lhe eram feitas, retornou aos Estados Unidos onde continuou a estudar, doutorando-se com a tese “A Theology of Human Hope”.  Novamente no Brasil, é nomeado professor da Unicamp. Autor de mais de cinqüenta livros em que se expressa como filósofo, poeta, teólogo, pedagogo é considerado um intelectual dos mais respeitados no Brasil. Neste ano de 2004, publica, pela Verus Editora de Campinas, Ao professor, com o meu carinho. São oito crônicas, algumas das quais já anteriormente publicadas, reunidas num pequeno livro de treze por dezoito centímetros e sessenta e duas páginas, sob um tema sabidamente inesgotável e de inúmeras vertentes: a educação.

            Rubem Alves, ao longo de seus anos como professor, percorreu um caminho, dizem, com olhos de ver e de sonhar. E, perseguindo o desejo de um sistema educacional mais acertado e mais justo, não pôde fugir às constatações dessas incongruências que o cerceiam.           

Na crônica – assim definem o seu texto os editores – “Sobre os perigos da leitura”, relata o episódio ocorrido numa prova de seleção ao doutoramento realizada na Unicamp. Como é de praxe, uma imensa lista de livros cuja leitura era exigida. A banca, sob orientação de Rubem Alves, seu presidente, aceita não se ater às possíveis memorizações – muitos idiotas tem boa memória – e sim, pedir, apenas: Fale-nos sobre aquilo que você gostaria de falar. Algo deveras inusitado e que gerou não somente assombro entre os candidatos, mas, verdadeiro pânico, pois, não haviam sido treinados, desde a infância, para papaguear os pensamentos dos outros. E a reação de uma candidata que só conseguiu repetir compulsivamente a teoria de um autor marxista, o faz concluir que O excesso de leitura a havia feito esquecer e desaprender a arte de pensar e que esse processo de destruição do pensamento individual é uma conseqüência natural das nossas práticas educativas. Sobre as quais, embora tão facilmente passíveis de crítica, Rubem Alves não se detém e lembra dois autores alemães – Schopenhauer e Nietzsche, cujos textos transcreve – que já haviam constatado os perigos da leitura.

Na verdade, ainda que sejam sumamente respeitáveis os autores citados e suas idéias, quando se trata de Brasil, é preciso ter cautela ao falar em perigo da leitura. Porque não apenas se trata de um país que possui vergonhosa taxa de analfabetos, como também, um imenso número daqueles que tidos por alfabetizados não entende o que lê, tornando inexistente, então, o perigo de uma leitura que, ao invés de ser proveitosa, obnubila inteligências. Tanto quanto a sua falta, pois o que soe acontecer no país é que, entre os verdadeiramente alfabetizados, a maioria não cultiva o hábito da leitura, seja a de livros, seja a de jornais. Ou, somente compra livros – o que nem sempre é garantia de leitura – que figuram nas listas dos mais vendidos, num submisso atrelar-se ao gosto de outrem ou às opiniões, por vezes aleatórias ou inspiradas nos que acontece nos pólos considerados irradiadores de cultura, que, certamente, norteiam também as bibliografias universitárias.

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