domingo, 27 de fevereiro de 2000

As esquecidas.

          É tida pela primeira mulher espanhola a pisar em terras do Continente que mais tarde seriam do Chile. E, embora, possam ter escutado o seu nome, muitos dos chilenos de hoje não sabem, exatamente, de quem se trata. Para outros,  conhecedores de algo ou de muito da História de seu país, foi uma das grandes heroínas da Conquista. No entanto, não é muito o que sobre ela é possível conhecer. Num  interessante artigo, publicado na revista  Alpha (número 15, 1999) da Universidade de los Lagos, Osorno, Chile, a professora Susan Stringer-Ó Keeffe, retoma os documentos da época (ou posteriores) em que o seu nome aparece, assim como a sua presença em textos ficcionais para delinear-lhe um perfil. A primeira constatação que faz é de que houve uma tendência dos cronistas seus contemporâneos de sobre ela silenciar: Inês Suárez, muitas vezes, foi eludida dos documentos oficiais. Assim, Pedro de Valdívia, ao escrever para o Rei D. Carlos V sobre o descobrimento do Chile, não lhe menciona o nome pois que dela era amante e ele tinha esposa na Espanha. Na sua Historia de Chile, Cóngora Marmolejo, sem citá-la, a ela se refere mas para condená-la por viver em mancebia. Também, outro historiador, Thayer Ojeda, ao tratar da formação da sociedade chilena diz, somente que era esposa de Rodrigo de Quiroga. Também, alguns historiadores estrangeiros lhe ignoram a presença. Há, porém, os que lhe outorgam um papel  importante na História do Chile. O próprio Pedro de Valdívia, ao lhe conceder, em 1544, uma encomenda, fala de suas destacadas ações e, alguns anos depois, o cronista Mariño de Lovera reafirma, com Sor Imelda Cano Roldani, o heroísmo  de Inés Suárez. Paralelamente às obras históricas, a professora Susan Stringer-O’Keeffe  apresenta, também, o gênero – e são vários textos – que mistura história e ficção, procurando estabelecer discrepâncias entre a corrente histórica e a que chama histórico-literária.

          Evidentemente,  muitos fatos – quando chegou Inés Suárez ao Novo Mundo, seus motivos, em que circunstâncias conheceu Pedro de Valdívia – permanecem sem resposta. Alguns dados são inegáveis: que partiu na expedição para Cuzco, em janeiro de 1540, como criada e que pela sua atitude corajosa e cristã vai adquirindo entre os soldados uma autoridade, cujas ordens tem a certeza de que serão obedecidas. Outros, são devidos à imaginação do romancista. Entre esses, se destaca Jorge Guzman que, em 1993, publica Ay Mama Inés onde Inés Suáez irá aparecer, numa clara tentativa de humanizá-la, como um ser de carne e osso, dominado por sentimentos e paixões. Já envelhecida, livre de uns e de outros, vai refletir sobre a sua vida e sobre o que vê a seu redor: atrozes maldades. Lamenta, então, que os seus sonhos e os de Pedro de Valdívia tenham ajudado a reproduzir na América as iniquidades da Península  Ibérica. E, então, em meio à verdades e à invenções, emergem suas façanhas e suas virtudes. Porém é impossível não aceitar  que muito do que realizou ficou no esquecimento porque era apenas mulher num mundo masculino e, sobretudo, mulher que ao assumir um amor extra-conjugal estava fadada a ser vítima dos preconceitos morais e sociais. E de um esquecimento que faz diluir-se o seu verdadeiro papel na Conquista do Chile. Como também ocorreu com o de outras mulheres, extraordinárias, cujos feitos foram ignorados e cujos nomes a História não registrou.

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