Numa
co-edição da Editora Mulheres de Florianópolis e da Editora Movimento de Porto
Alegre, foi publicado no ano passado, Sorrisos
e prantos de Rita Barém de Melo. Trata-se de uma edição baseada na primeira
e única que apareceu, postumamente, em 1868, na cidade do Rio Grande. Agora,
com o texto atualizado por Rita Terezinha Schmidt que assina, também, a
Introdução, esses versos da poetisa gaúcha podem, finalmente, ser conhecidos o
quê a edição do século passado pouco permitiu até porque – e são palavras de
Rita Terezinha Schmidt – as obras dos
escritores sul-riograndenses, via de regra, têm sido marcados historicamente por uma posição de
invisibilidade no cenário da cultura
nacional. Assim, ao possibilitar a leitura de Sorrisos e prantos, as editoras estarão, também, ensejando – e é
preciso pensar na pesquisa que está sendo feita nos cursos de Mestrado e
Doutorando – uma devida e cuidadosa apreciação crítica que lhe tem sido, como à obras de outras
poetisas brasileiras do século XIX, continuamente, negado. No estudo que lhe dedica, Rita Terezinha Schmidt
esboça algo de sua biografia – Rita Barém de Melo nasceu em Porto Alegre em 1840,
seus estudos não foram, como era próprio da época, além do curso primário, se
casou aos dezessete anos, teve dois filhos que morreram ainda crianças e
faleceu aos vinte e oito anos na cidade do Rio Grande – cujas contingências,
acredita, não podem ser separadas de uma personalidade marcada pela dor, pelo abandono, pela solidão.
Rita
Barém de Melo teve seus primeiros versos publicados aos dezesseis anos no
semanário O Guaíba de Porto Alegre,
sob o pseudônimo de Juriti, o pássaro
brasileiro de fundo de quintal e das roças do interior, de canto agradável e
nostálgico. Ao identificar-se com o seu canto, Rita Barém de Melo como que
enuncia ser o seu um versejar ingênuo e espontâneo. Aproximar-se dele é
perceber o quanto é expressão das perdas
sofridas pelas mortes e separações, ou dessa dor de viver marcada pela solidão
e pelas saudades ou de reflexões sobre um mundo de mentiras e amargor. Também, o quanto pode ser expressão de vida.
Dominado
pelo desencanto que não condiz com os seus dezesseis anos, o poema “Pra que
viver-se”. Seus primeiros versos – “Pra
que viver-se uma vida/ Que a morte irá matar?/Pra que viver-se a existência/Se num túmulo irá findar? –
interrogam, afirmando algo sem dúvida inerente à condição humana, sua única certeza: o efêmero da existência.
Nos versos seguintes, em cada estrofe, a reafirmação de que tudo (o fogo que nos alenta, o que nós sentimos, o viço das flores
d’alma, a esperança ditosa, a flor da vida) é transitório. Termina
aconselhando: Ah! Não choremos a vida/Que
ela sempre findará/ Não rossiemos
de pranto/O que a morte beijará. Fatalismo
que está em acorde com
expressões que pontilham seus
versos (flores de dor, dor profunda, flor de tristeza, pungente
tristor) e , também, em acorde com outros poemas em que a poetisa
se mostra sem ilusões diante de um mundo que percebe como fingido e traidor. Mas que, no entanto, não a vence. O poema “Não dobra
a vontade de meu coração”, revela que embora ferida, Rita Barém de Melo, comparando-se ao carvalho
resiste às intempéries da vida e não se dobra, não se abate, não verga, nem
quebra mas se mantém soberba e altiva. O que a leva, a ser, então, senhora de versos iluminados, verdadeiros cantos de amor e de
amor à vida. Assim, o poema “Como eu te amo” em que as onze primeiras estrofes, nas perguntas feitas ao ser amado, dizem
sobre a imensidão (como contar as estrelas do céu? quantas vagas nascem e
morrem no mar? quantas nuvens despontam na aurora ? quantas flores
reverdessem?) desse amor que lhe é dedicado. Nas outras três, finalizando o
poema, o testemunho da alegria de amar:
a cisma, o sonho, a ventura, as esperanças, os enlevos. Sem dúvida, um poema de feliz inspiração e
tanto quanto ‘Pra que viver-se”, escrito no ano de 1856. Neles, a alegria intensa e a profunda tristeza constroem essa
dualidade luz e sombra que o título do livro, Sorrisos e prantos, sintetiza. Dualidade a sugerir nuanças numa
poesia que, certamente, ainda guarda, por desconhecida, muitos de seus
segredos.
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