-
Morreram todos os
rebeldes, senhor.
E
o Gobernador respondeu:
-
Bem mortos estão.
No dia 5 de
setembro de 1938, um pequeno grupo de estudantes num plano, certamente, de
esperanças desvairadas, se enclausura no prédio da Universidade, em Santiago do
Chile e de lá começa a atirar contra o Palácio do Governo. Muito depressa veio
a reação. Tanques apareceram, bombas
derrubaram as portas, alguns estudantes morreram e os outros foram conduzidos
para o edifício do Seguro Obrero onde, um a um, foram sendo assassinados..
O
local da cidade onde tudo aconteceu foi interditado por algumas horas e Carlos
Droguett ao sair do trabalho, já tarde da noite, pouco sabia além dessas
notícias, dizendo que todos os rebeldes haviam sido eliminados.
Um
ano depois, para que não fossem esquecidas essas mortes, ele escreveu uma
crônica, “Los asesinados del Seguro Obrero”, que anos mais tarde irá inserir no seu romance 60 muertos en la escalera (Nascimento, 1953).
No
romance, o relato dessas mortes, entremeado a outros textos
– digressões, o episódio de Corina, o episódio do Cupido – vai emergindo
pouco a pouco. De um ignorar (não havia
permissão para se aproximar do local, nem para tirar fotografias) para a
esperança de saber pelos jornais (as pessoas do jornal andavam em busca de
notícias) e, finalmente, para (com a saída dos jornais da noite) começar a
saber. Primeiro, que os estudantes – eram trinta e sete os sobreviventes -
saíram às duas horas da Universidade, golpeados
nos rins pelas carabinas maltratados pelas botas enlutadas e lisas que
lhes mordiscavam os pés.
Depois, já delineando perfis em longas
digressões ( o de Yuric, o de Enrique) e, logo, nesse conhecimento próprio de
um narrador onisciente, mostrando o estudante diante do companheiro ferido,
esvaindo-se em sangue. Então, a chegada
dos estudantes no edifício do Seguro Obrero, também ocupado por outro
grupo que procura se entrincheirar, amontoando móveis nas escadas. Mas, nada
nem ninguém os irá defender. Pouco a
pouco, eles vão sendo exterminados, empilhando-se os corpos pelas escadas. Há botas raivosas que chutam quem já está
deitado e sangrando; há as descargas de metralhadora seguidas do uso das
baionetas; há o tiro que ultima o moribundo; há os golpes no rosto dos feridos.
Eles eram muitos e o espaço em que os
matavam era pequeno. Por isso não se disparou uma vez senão repetidas vezes. Se
alguém se levantava, lhe era dado um tiro, se levantava outra vez, se lhe
dava outro tiro, se tornava a se levantar se lhe dava outro e assim até o
oitava, até o décimo tiro. E, ainda, o décimo primeiro pode ter sido necessário.
Já
anoitecia quando chegou o médico para atender os feridos. Ficou à espera no
vestíbulo do prédio, só escutando uns poucos gemidos ou algum grito. Logo, apareceu um oficial alto e maciço que subiu as escadas. Mal
tinham se passado dois ou três minutos quando a voz cortante, definitiva, lá de cima vociferava na escada, para o
vazio: Que saiam os médicos. Aqui não vai haver feridos.
Nas escadas,
mortos, ficaram os 60 jovens e suas esperanças.
Nenhum comentário:
Postar um comentário