Vila
Velha é uma pequena cidade que não fica
ali nem fica aqui, que fica em toda
parte mas não fica em parte alguma....
Por isso, o que nela acontece – e, tudo
é passível de acontecer – pode ter como cenário qualquer pequena cidade do
Continente onde quem manda é, sobretudo, aquele que não recua diante dos
desmandos e arbitrariedades. No caso de
Vila Velha é um coronel bonachão, um outro mais irritadiço ou um major e como
todos – abstraídos exatamente os exageros nocivos – eles inspiram, quase
sempre, o riso. Porque é natural e até esperado que os cidadãos dominados nada
sabem de cidadania e lhe permitem, inocentes, todas as esdrúxulas decisões.
Assim, pouco tino lhe é exigido e as situações em que exerce o seu poder
absoluto podem se apresentar, sobretudo, como
engraçadas. Em Vila Velha há
então quem mande prender tendo por base meras suspeitas ou internar no hospital
de loucos aquele que lhe parece destrambelhado; há quem ameace com escândalo ou com uma condenação à morte os viventes que o
incomodam e determine o extermínio de seus inimigos quando disso advenha
vantagens. Mas, é evidente, a autoridade também está sujeita a erros. E, exemplar,
o caso do forquilheiro. Pois tinha treze anos o menino quando, por acaso se viu
possuidor desse dom de achar água. Nas suas mãos a forquilha sempre entortava e
ele cresceu descobrindo água. E as secas não foram mais uma ameaça para Vila
Velha. No dia em que salvou a pecuária do
município, a autoridade decidiu enviá-lo para estudar em Porto Alegre. A
cidade inteira concordou pois, se desprovido de estudos descobrira água, “imaginem o que faria bem estudado.
Meio
sem achar que merecia, ele foi para a capital. Nas férias, voltou e descobriu
cinco poços novos. No segundo ano, teve compromissos e no seguinte, foi visitar
parentes. Só depois de formado é que voltou para Vila Velha onde uma seca já o
esperava. Mal desceu do ônibus, já lhe mostravam os campos amarelados e logo veio o pedido para que pegasse a forquilha. Admirou-se e
um pouco encabulado explicou que aquilo era superstição. Nem acabara de falar, levava um sopapo e
carregado por quatro, protestando que
era um homem civilizado, foi levado para
o campo com a forquilha na mão. Mas, nem barro encontrou e só foi salvo da
raiva, provocada nos seus concidadãos,
porque o padre chegou para salvá-lo. No dia seguinte, teve que ir embora da
cidade porque seu pai, cheio de indignação, o expulsou de casa exclamando: – Doutor,
a gente já tem que chega, o que tá faltando
aqui é forquilheiro.
Este
caso, um dos trinta que são narrados por Sérgio Jockyman na voz desse menino
que foi crescendo e ouvindo histórias na botica de seu pai e que se propôs
contá-las para que não se percam. Vila
Velha, publicado pela Garatuja de Porto Alegre, em 1975, é o resultado
desse escuta que te escuta.
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