O breve texto
foi escrito em 1979 e tem por título “La canción de los presos”. Anos depois, é
parte do livro Contraseña, publicado
pela Ediciones del Sol de Buenos Aires, em 1992. Nele, Eduardo Galeano fala
desses poemas escritos em papel de cigarro que se esgueiraram da prisão El
Penal de Libertad de Montevidéu, a principal cárcere de presos políticos da
época ditatorial do Uruguai.
São versos anônimos,
escritos por alguns dos muitos que foram apanhados pelo Sistema e que dão fé de
ainda não terem sido plenamente alquebrados. Há o poema de amor singelo, pura
simplicidade, no qual se engasta, certeiramente, a certeza da prisão que se
apresenta como algo menor diante do sentimento confessado; há o que menciona,
sem rodeios, a tortura; o que constata as contradições entre aqueles que
torturam ou que, torturando, se apropriam da música e das canções dos artistas
que pregam a liberdade, assobiando-as ou cantando-lhes as estrofes. Também,
aqueles versos que falam da dignidade: do desejo de não expor ao inimigo a
fraqueza das lágrimas. Ou, outros em que a solidão se mostra vencida pela
capacidade de acreditar no diálogo, ainda que seja com os insetos, pois eles, sim, podem circular, livremente,
pela cela. Ainda, aqueles que testemunham, convictos, a solidariedade. A
solidariedade que os fez lutar pelos demais e, então, sofrer as conseqüências
de querer uma vida justa para todos. E que não esmoreceu diante das infâmias
dos que delataram, dos que prenderam, dos que torturaram, muitas vezes até a
morte, mas se alça para expressar uma profunda esperança ao convocar: Ânimo companheiros!/ se está o inimigo/ estamos nós! Antes de mais
nada, porque aquele que faz versos, está certo de que na vida jamais se está verdadeiramente só.
A par da
espontaneidade e da singeleza a fazer cada poema, a síntese da experiência de
um ser humano, vivendo uma situação limite, a situação que lhe deu origem, o
espaço em que veio à luz e os caminhos que percorreu para chegar, enfim, a seus
destinatários, fazem dessa expressão algo de muito raro. Sobretudo, porque
leva, ainda uma vez, a perceber e a reafirmar que as aproximações à Literatura
Latino-americana não podem ser feitas seguindo os parâmetros do Primeiro Mundo,
quando eles se limitam a estudar um texto, ignorando-lhes o contexto e limitando, assim, a sua compreensão,
bem como a compreensão do espaço no qual foi engendrado.
Reler, vinte
anos depois de ser publicado, esse texto de Eduardo Galeano e os poemas que ele
dá a conhecer, permitem perceber o
quanto – no lirismo de que são feitos – eles possuem de beleza e de verdade.
Também o quanto são testemunho do que aconteceu no Uruguai da ditadura, o quê
não deve nem ser ignorado nem esquecido.

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