O
último texto que Antonio Cornejo Polar escreveu, “Mestizaje e hibridez: los
riesgos de las metáforas”, foi lido no Congresso da LASA (Latin American
Studies Association), realizado em Guadalajara, México, em 1997 e publicado no
volume Perfil y entraña de Antonio Cornejo Polar (Lima,
1998).
Prestando-lhe
uma homenagem “in memoriam”, a revista Casa de las Américas (número 212,
julho-setembro de 1998) publica a segunda parte desse texto sob o título “Del
testamento intelectual de Antonio Cornejo Polar”. Na verdade, apenas umas
poucas linhas, agrupadas em sete parágrafos, mas cuja importância reside nesse
constatar que os textos latino-americanos são analisados segundo artefatos críticos sofisticados,
escritos em inglês e, de acordo com os
velhos modelos industriais, devolvidos ao seu espaço natural que, então,
deve passar a entendê-los conforme os cânones que lhe são estranhos.
Lecionando
o crítico peruano na Universidad Mayor de San Marcos em Lima e na University of
California, em Berkley, Estados Unidos, pode, a partir dessa dupla experiência,
observar os estudos literários, produzidos num e noutro contexto e constatar as
situações que determinaram a crítica assim produzida. E assinala algumas
situações que a irão definir: nos Estados Unidos, a abstração de uma produção
crítica latino-americana, preterida pela bibliografia em língua inglesa,
consequentemente, textos latino-americanos estudados, sobretudo, a partir de
uma metodologia crítica em inglês. Na América Latina, o desconhecimento da
língua inglesa por parte de um grande número de estudiosos que, então, ignoram
ou apenas conhecem, com atraso, os aportes escritos nessa língua o quê os
marginaliza.
Fica
estabelecida, desse modo, uma hegemonia: a da crítica em inglês. A partir dessa
constatação de Antonio Cornejo Polar é fácil lembrar o que ninguém ignora:
quanto a produção intelectual latino-americana continua atrelada aos centros
irradiadores de cultura do hemisfério norte. Tampouco ninguém ignora o quanto
as fronteiras culturais entre os países do Continente são intransponíveis.
Verdadeira muralha a separar os países entre eles, a mesma que os irá levar a
uma subserviência que não lhes permitirá se dar conta de que a produção do
Continente deve ser considerada a partir de seus próprios pressupostos críticos
e sem deixar de levar em consideração o contexto em que se originam.
Antonio Cornejo Polar se
refere, por exemplo, à maneira como as ditaduras ( a censura, a marginalização
do intelectual) e o neoliberalismo (política de empobrecimento das instituições
culturais públicas) destruíram as bases
materiais para o desenvolvimento da crítica e, sabe-se como induziram,
ainda mais, à submissão das idéias alienígenas. O resultado é a inexistência,
na grande maioria dos casos, de uma posição crítica e metodológica,
verdadeiramente enraizada na América Latina. O que predomina – e isto o diz
Antonio Cornejo Polar – é um estranho
artefato totalmente feito em inglês, precisamente no idioma da hegemonia que
fala para si mesmo do marginal, subalterno, pós colonial que a assim
considerada elite aceita e procura imitar sem se dar conta de seus reais
significados. Deixa-se, convicta, seduzir por algo que mal ou pouco entende,
sendo-lhe suficiente saber de onde provém as idéias e teorias para assumi-las
com entusiasmo.
Antonio Cornejo Polar
termina as breves considerações, desejando que suas palavras não sejam tomadas
como um presságio, mas como um cordial aviso do que seria o esfarrapado e pouco honroso final do
hispano-americanismo.
Tendo em vista que hoje o
mundo se mostra nas mãos de um único dono e que ele se atribui o direito de
tudo determinar, infelizmente, é ilusório pensar que, em se tratando da
cultura, poderia ser diferente. Se uns poucos podem perceber o quê significa a
hegemonia reinante e se dispor a navegar contra a maré, isso é dar testemunho
de esperança. E certamente da esperança, desde sempre, o Continente se
alimentou.

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