A
Mercado Aberto de Porto Alegre acaba de publicar História de um louco amor de
Horacio Quiroga . O
romance foi publicado no ano de 1908, em
Buenos Aires. Como o titulo o indica é a história de um amor e de um amor que,
no original (Historia de un amor turbio
) o adjetivo qualifica de turvo, conturbado, confuso e não louco como quer o
tradutor. Rohán, o personagem masculino corteja Mercedes, provocando o amor de
Eglé, então menina de oito anos. Uma
longa ausência interrompe esses afetos e, oito anos depois, irá cortejar Eglé
embora continue no jogo de sedução, do
qual não estão ausentes os beijos com Mercedes. O romance com Eglé fracassa e,
novamente, ele se afasta. Outros anos se passam, agora dez e, numa visita que
faz às irmãs, comprova que se tonou impossível reviver o amor que havia
sentido.
Na
verdade, mais do que uma história de amor talvez fosse preferível dizer que se
trata de um esboçar das relações que Rohán institui com o amor. Relações que se apresentam, sempre,
equívocas.
Não
há um só diálogo em que as almas se mostrem transparentes. As palavras são
sempre dúbias e estabelecem o ponto de vista narrativo em que o leitor
permanece à margem do desejo, dos sentimentos, do pensar do personagem.
Primeiro,
Rohán se insinua para Mercedes e nas freqüentes visitas surgem momentos que se
aproximam de uma declaração de amor. No
entanto, dela, ambos como que fazem
questão de fugir. Depois, a beleza de Eglé, adolescente, o atrai e o leva
a uma aproximação que será todo um
itinerário de percalços amorosos: palavras caladas, outras mal interpretadas ou
dissimulando sentimentos ou trapaceando para escondê-los. São gestos apenas
percebidos – pálpebras que estremecem, um olhar que se perde, um movimento
impaciente – insinuando emoções.
Pode
acontecer que Rohán acredite amar Mercedes para , imediatamente, sentir que seu
amor é por Eglé. Mas, esse amor por ela é cheio de dúvidas e inseguranças e
preconceitos que se mesclam a sentimentos de impaciência, aborrecimento,
gratidão, pena, ciúmes e ódio e que irá se deteriorar até um rompimento
inesperado e definitivo.
Constituído
de pequenos momentos, de rápidas cenas amorosas e, sobretudo, dos estados de
alma de Rohán, Historia de un amor
turbio é, principalmente, o belo e profundo estudo de um perfil masculino.

E
isto talvez não tenha sido entendido pelos seus contemporâneos. A crítica
latino-americana da época houve por bem afirmar que Horacio Quiroga foi um mau
romancista e tanto Historia de un amor
turbio como Pasado amor (1926)
foram relegados diante das qualidades atribuídas a seus contos.
No entanto, já em 1968, Emir Rodriguez Monegal no Prólogo ao romance, edição do Ministério da Cultura do Uruguai, tenta uma reconsideração de seu juízo crítico que baseia em aproximações com aspectos da biografia de Horacio Quiroga. Embora sem ter tido seguidores, seu estudo significou um breve alerta porque uma análise mais cuidadosa dessas duas obras evidencia-lhes atributos que foram ignorados por aqueles que sobre elas opinaram apressada ou inadequadamente.
Agora,
aos noventa anos de publicada, Historia de un amor turbio, ao ser
traduzida para o português, atravessou fronteiras. Vista por outros olhos e
numa outra época receberá apreciações que irão instituir uma mudança no seu
destino. Certamente, não mais se
apresentará como o de uma obra menor.

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