É um
repassar de textos. Desde os primeiros,
quando Montevidéu não passava de um amontoado de casas até aqueles escritos
nestes últimos anos: Montevideo, la
malbienquerida de Ana Ribeiro que a Academia Nacional do Uruguai publicou
em 1997.
São
cento e oitenta e seis páginas nas quais Montevidéu foi narrada, descrita,
interpretada, discutida por viajantes, cronistas, escritores, por vozes
anônimas ou coletivas. Há quem note a
sua paisagem; há quem note a sua gente; há quem note os seus costumes. E ela
vai se desenhando no lento passar do tempo, vai se mostrando, transformada.
Cidade
cobiçada na Colônia, defende-se dos cercos. No século XIX, luta pela
independência. Mais tarde, massacrada por outras opressões, nada pode fazer a
não ser se submeter. Depois, reagir, se
libertar.
Sob
a rubrica “Ciudad posmoderna”, a cidade da maioria calada quando as palavras
são, sobretudo, retalhos, flashes
entrecortados, mistura de lembranças e cartas velhas, vozes e figuras de rádio
e televisão e muito silêncio fraturando a memória. Porque a Democracia ao
cair abatida pelo golpe militar levou os escritores ou a se submeterem à
censura e a se auto-censurarem ou a partirem
para o exílio. Então, diz Antonio
Muñoz Molina, Montevidéu se
converteu assim numa cidade desejada ou recusada, reconstruída no exílio,
povoada primeiro de ausências e logo de regresso. São os
poemas de Mario Benedetti, são os textos de La canción de nosotros de Eduardo Galeano.
Foram
doze anos de silêncio até que as vozes
puderam, outra vez, irromper. E, embora, para os escritores, o início de
uma reconquista da qual não esteve ausente a melancolia de um reencontro, por
vezes, desiludido, Montevidéu foi, outra vez, mensurada, diagnosticada,
cantada, resgatada.
Suas
distintas faces se sucedem desenhadas pelas emoções dos que deixaram os
testemunhos. Hábil e perspicaz, Ana Ribeiro os colige e seu livro se esmera em
tornar possível a trajetória de uma cidade que nesse descobrir-se deixa ver
algo que é comum a todas as outras e,
também, a nenhuma.
Parte
do Continente – os textos assim o mostram – Montevidéu é uma cidade que tem a
marca do incompleto e do inconfundível.

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