domingo, 1 de março de 1998

O grande risco

           É uma leitura árdua: extenso relatório colmado de nomes e de siglas e decretos e negociações. Noticias de un secuestro, um milhão de exemplares vendidos somente em espanhol                 

           Em outubro de 1993, Maruja Pachón propôs a Gabriel García Márquez que escrevesse um livro sobre a sua experiência de seis meses como seqüestrada do narcotráfico e das diligências de seu marido para libertá-la. Ponto de partida de um livro que, no dizer do escritor colombiano, foi o mais difícil e triste de sua vida, uma história real contada pelos protagonistas que viveram o drama.

            O livro se inicia com o seqüestro de Maruja Pachón às sete e cinco da tarde numa Bogotá de céu turvo e triste. Mas, Gabriel García Márquez não irá contar somente o que a ela aconteceu a partir desse momento até aquele em que foi libertada, conforme seus relatos, mas, também, o que conseguiu saber dos outros nove que, igualmente, foram seqüestrados na época.

             Assim, no livro se entremeiam os textos que narram o que foi para Maruja Pachón e suas companheiras, Marina Montoya e Beatriz Villamizar de Guerrero, o cativeiro e os que tratam das negociações para conseguir-lhes a liberdade.       

             Gabriel García Márquez não se permite recursos de estilo e busca, apenas, a objetividade de um texto cuja proposta é a informação.

              Porém, para falar da situação de um país que somente se deu conta de sua importância no tráfico mundial de drogas quando os traficantes irromperam na ala política do país pela porta as fundos, primeiro com seu crescente poder de corrupção e depois com aspirações próprias foi necessário possuir uma gama de dados tão grande como aquela imprescindível para tratar do motivo principal da guerra iniciada pelos narcotraficantes: o terror diante da possibilidade de ser extraditado aos Estados Unidos onde poderiam ser julgados por delitos ali cometidos e, então,  passíveis de sofrer penas muito grandes.

              Assim, na sua grande maioria, o texto de Noticias de un secuestro registra o longo itinerário que persegue não apenas uma solução satisfatória para a libertação dos reféns mas, também, aquela que atenda as pretensões dos narcotraficantes.

             Breves tréguas, o perfil que o romancista traça de Rafael Pardo, designado pelo Presidente da Colômbia para ser o mediador entre o governo e a família dos reféns ou o de Marina Montoya que, depois de meses de cativeiro, foi condenada à morte. Tanto o seu estar na prisão como os últimos momentos em que nela passa são de uma grande dramaticidade, cujos tons se reforçam diante da impossibilidade de saber se teve ou não consciência de estar sendo conduzida a seu fim ou se morreu acreditando que a agraciavam com a liberdade.

            No texto que antecede Noticias de un secuestro, Gabriel García Márquez agradece aqueles que, de alguma forma, o ajudaram a realizar a obra e expressa a esperança de que nunca mais suceda o que foi motivo de seu livro. Mas, qualquer que tenha sido a sua intenção, ao escrever a obra, não foi julgado inocente pelos narcotraficantes. Cada vez que vai a Colômbia, três guarda-costas vigiam pela sua segurança.

           Parece que, ao dizer que o grande risco na América Latina é estar vivo, ele sabe do que está falando. E quem toma conhecimento da sua frase e não ignora o que ocorre no cotidiano do Continente, não pode, tampouco, dela discordar.

                                  

 

 

 

 

 

 

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