domingo, 25 de agosto de 1996

Dyonélio Machado

          Trata-se de um dos maiores romancistas brasileiros e é, ainda, quase um desconhecido entre aqueles que lêem no país: Dyonélio Machado, nascido em Quaraí, Rio Grande do Sul, então uma pequena cidade de menos de vinte mil habitantes, no dia 21 de agosto de 1895, órfão de pai assassinado quando tinha sete anos e começando a trabalhar para ajudar a mãe, aos oito.

          Artur Madruga, que em setembro de 1986 escreveu a primeira biografia de Dyonélio Machado, numa curiosa síntese sobre a profissão que exerceu disse que na Medicina ele teve o seu sustento, na Política o seu tormento, na Literatura o seu alimento.

          Médico, introdutor da psiquiatria no Estado do Rio Grande do Sul, trabalhou durante trinta anos como psiquiatra ou como Diretor do Hospital Psiquiátrico São Pedro de Porto Alegre, foi deputado comunista na Assembléia Legislativa de seu Estado e autor de ensaios e romances.Seu primeiro livro publicado, Política contemporânea, é de 1923; o  segundo, um volume de contos, Um pobre homem, de 1927. De 1933 é Uma definição biológica do crime, sua tese. De 1935, Os ratos.
Considerado esse romance sua melhor obra, sua obra definitiva, parece impossível falar de Dyonélio Machado sem a ela fazer uma referência. Sou o romancista de um romance , disse uma vez com algo de melancolia. A opinião da crítica e as dezessete edições que se sucederam soem lhe dar razão, assim como o prêmio recebido em 1935.

          Para concorrer ao Concurso da Companhia Editora Nacional de São Paulo, escreveu em cinco horas de vinte noites, o romance cuja concepção havia durado nove anos.

          O jurado, por entender que entre as obras que se apresentaram, quatro estavam em igualdade de condições, outorgou o Primeiro Prêmio de Romance Machado de Assis a essas quatro. Uma delas era Os ratos de Dyonélio Machado.

          Curiosamente, ele soube do prêmio na escala que o Itaimbé, barco de carga, fez no porto de Santos. Estava  nos porões do navio, juntamente com outros vinte presos políticos levados, como ele, para as cárceres do Rio de Janeiro onde  acabou ficando  um ano.

          Posto em liberdade, volta ao sul, para a sua pequena cidade onde o esperavam sua mulher e seus filhos. Ao retornar a Porto Alegre o faz justamente no dia em que Getúlio Vargas instaura a ditadura no país. Dyonélio Machado decide que não mais será preso e foge pelo litoral, buscando proteção na casa de amigos.

Quando a situação se tranquiliza, é reintegrado nas suas funções do Hospital Psiquiátrico e retoma sua vida de médico, escritor e jornalista.

É quando adoece gravemente. Uma cardiopatia o mantém meses na cama. Desafiado pela morte, decide viver escrevendo um livro. Muito fraco para fazê-lo, ditava para a mulher e para a filha e, então, os amigos datilografavam o texto, um romance chamado O louco do Cati, publicado em março de 1942.

Já curado, escreve Desolação (1944) e Passos perdidos (1946). E, trinta e cinco anos depois, Nuanças.
Esses quatro romances, como muito bem o disse a professora Zenilda Grawunder no número 10 dos Cadernos Porto e Vírgula (Porto Alegre, 1995) estruturalmente autônomos - tanto que publicados em diferentes épocas – mas que apresentam entre si detalhes de unidade temática, reiteração dos personagens, elementos simbólicos e históricos e uma narrativa continuada, criam um universo extremamente representativo de certo espaço e de certo tempo de vida do país.
Aproximar-se deste mundo ficcional de exceção que, além da grande qualidade literária, faz um desenho do país que permanece quase desconhecido de sua gente, leva a infinitos descobrimentos.
No entanto, essa aproximação ou pela falta de pesquisadores na Universidade, devido às já tão conhecidas razões;  ou por opções ideológicas que levam a estudos mais simpáticos ao Sistema; ou pelo alheamento de uma elite universitária por assuntos concernentes ao país, tem sido, salvo as sempre honrosas exceções, postergada.
E, Dyonélio Machado, autor de uma obra de valor excepcional e que ultrapassou os modelos literários de sua época continua sendo ignorado por um grande número de leitores e esquecido pelas casas editoras.

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