
domingo, 31 de março de 1996
No palco

domingo, 24 de março de 1996
A resposta.4
Como todos os demais escritores a
quem foi perguntado, “ o quê tem
significado para você a Revolução Cubana?”,
pela revista Casa de las Américas que no seu número 212 de 1979 lhes
publicou as respostas, Jan Carew (1923, Guiana Inglesa) e Gérard Pierre-Charles (1935, Haiti) se mostram profundamente tocados pela incrível luta, pela
quase impossível e inacreditável vitória que fizeram da Ilha de Cuba um
luminoso fanal e guia.
Para Jan Carew, Gérard
Pierre-Charles e para os intelectuais e artistas da Argentina, Colômbia, Chile,
Costa Rica, México, Nicarágua, Panamá, Peru e Venezuela foi a imensa
descoberta: saber que o sonho podia ser possível e para todos do Continente.
Nascido na Guiana, Jan Carew
ainda era súdito do Império Colonial inglês quando ouviu pela primeira vez
falar desses cubanos, guerrilheiros barbudos, que lutavam na Sierra Maestra.
Então, na Guiana, o primeiro governo progressista havia sido derrubado pelas tropas
britânicas. Era o ano de 1953. Muitos de seus compatriotas foram para a prisão
e da luta revolucionária de Cuba quase tudo era escamoteado pelas agências
noticiosas capitalistas, assim como escamoteadas foram as subseqüentes vitórias
ganhas no trabalho das plantações e das fábricas e nas escolas pelos que
desejavam estudar.
Nada evitava, porém, que as
palavras da Ilha fossem escutadas em segredo e que estivessem em uníssono com a
escolha do povo da Guiana Inglesa tão escravizado
e tão saqueado economicamente como os
outros da América Latina.
Talvez mais do que todos, o
Haiti acorrentado na ignomínia de seus Papa Doc, seu Tontons Macoutes, seus
Baby Doc onde escutar a Rádio Rebelde de Cuba era motivo para uma condenação à
morte. Para fugir do terror que no Haiti se instaurava, Gérard Pierre-Charles
deixa a pátria e nas suas andanças do exílio tem sempre os olhos postos em Cuba
que representava o triunfo pleno contra a
expressão do capital, contra o colono
branco e seus lacaios locais. Lamentando que na sua terra, os impérios
econômicos ianques eram tanto quanto os governantes os verdadeiros donos do
país, isto é, donos da bauxita, do café,
do açúcar, da venda de sangue e de cadáveres.
Oriundos de espaços
diferentes, Jan Carew e Gérard Pierre-Charles entrelaçam a esperança no caminho
seguido por Cuba a esse testemunho do que ocorre em seus próprios países,
territórios dominados pela minoria que ignora os marginalizados do Continente onde
reina o saque, a usurpação e a grande
indiferença dos que possuem por aqueles que nada têm. Razões suficientes
para levar Jan Carew à certeza de que a
decisão de um povo pode derrotar as forças do imperialismo e reafirmar a
Gérard Pierre-Charles que a Ilha distante apenas setenta e oito quilômetros de
seu país, emerge como a síntese histórica
de todas as lutas e esperanças do Haiti,
dos povos do Caribe, da América Latina.
domingo, 17 de março de 1996
A resposta. 3
...Cuba, lírio de fuzis,
Oh! Necessário lírio de fuzis
Roberto Luzcando
Em versos foram suas respostas à pergunta formulada pela Revista Casa de las Américas - “ o quê tem significado para você a Revolução
Cubana ?” – publicadas no seu número 112 de 1979. O elo que une cada um desses poetas à Revolução Cubana
se expressa os poemas que rendem um preito de amor à Ilha e ao que nela germinou.Atraídos
por uma vitoriosa esperança de futuro, Cuba significa a luz, a vela acesa, o
sol. Filhos do Continente, Juan Gelman
(Argentina, 1930, Óscar Chávez (México,1935) e Roberto Luzcando (Panamá, 1939) levantam
a voz de espaços díspares e diferentes, estreitando um sentir que se revela igual
diante da queda do Quartel Moncada quando despertou
de repente nossa História / envilecida a força de tristeza / e pobre de seu estar encarcerada (Óscar Chávez).
E
estar encarcerada e envilecida é próprio da História do Continente. Quando o
argentino Juan Gelman chama Cuba de vôo
ou felicidade, de meu sol é por
acreditar ser o lugar da América onde o imperialismo
podia ser derrotado e a vitória, então, poderia ocorrer também no seu país
onde se consentia a fome, a dor, a tortura, a morte; onde o
inimigo era feroz e os que o
combatiam tinham os rostos iluminados
pelo direito de combater.
Pensando
no seu próprio país ou em todos do Continente é que Roberto Luzcando (venho do ismo panamenho ferido) escreve o longo poema que diz
das lutas de Cuba (golpeada por um réquiem de fuzis), do anseio de que livre
Cuba permaneça (Não quero mais ver em
tuas baías / os verdes tubarões / que escoltam tuas vítimas libertárias, / teu
amor desenvolvido pelas ondas).Luta e liberdade que no Continente se
ergueram como fanal, indicando ser possível a mudança de destinos ainda que o
confronto se faça entre um minúsculo contendor e outro portentoso e,
aparentemente, invencível.
Os
poetas se permitiram enredar na emoção e prender na esperança. E disso deixaram testemunho.
domingo, 10 de março de 1996
A resposta. 2
Ou a RevoluçãoCubana como descobrimento, como
redescobrimento do homem, de seus padecimentos, de suas golpeadas e negadas
vidas, de suas desvanecidas esbanjadas mortes. A Revolução Cubana como uma
descoberta, uma afirmação e um repto do que somos nós todos, cubanos,
antilhanos, chilenos, peruanos, argentinos, bolivianos, paraguaios, uruguaios,
brasileiros, equatorianos, colombianos, venezuelanos, americanos integrais,
integrados no padecimento, no sonho, na liberdade, na luta, na esperança, seres
do Terceiro Mundo, seres do penúltimo
mundo da reiterada injustiça e da postergação institucionalizada.
Em
1979, Carlos Droguett já vivia fora do Chile. No exílio, pagava o crime de
querer para seu povo um destino justo: a vida que deveria ser um direito de
todo e qualquer ser humano onde quer que viva.
Assim,
sua resposta, à pergunta formulada pela revista Casa de las Américas " o quê tem significado para você a Revolução Cubana?", publicada no seu número 112, sua longa resposta é para várias perguntas ou para uma pergunta
feita de diversos graus de paixão. Nela cabem suas
emoções, a de um homem transformado pelo terrível dia 11 de setembro de 1973 em
que foi bombardeado o Palácio de la Moneda e as figuras de muitos desses que de
uma ou outra maneira, se ofertaram pelo Continente: O Che, Salvador Allende,
José Marti, Emilio Ballagas, Cirilo Villaverde, Ignácio Ossa, os desconhecidos heróis
das muitas lutas libertárias, os torturados pela opressão dos regimes que se
sucediam.
E
sua emoção é feita do sofrimento daqueles que procuraram dar forma aos seus
sonhos e então foram maltratados e mortos; é feita dos sonhos que vislumbraram
caminhos para os povos do Continente; e de suas próprias esperanças e
convicções.
Daí
se entremearem no texto expressões que definem a Revolução cubana: praga benfeitora, multiplicada e multiplicadora, um milagre cotidiano, um
significado para os vivos, para os
corpos e almas em movimento em direção da vida, imenso e testemunhal espelho no qual se reflete – como era, como é, como deveria ser – o mundo
inteiro. Daí mostrar-se claro o laço que o une a essa concretização de algo
desejado e que o alimenta porque a ela, à Revolução Cubana deve (ele diz) essa juventude que são meus livros abertos
de par em par, esta vida que continuo gastando como é devido, pelas duas
pontas, a do homem, a do testemunho.
E, exatamente por ser capaz de ver e de entender o que
ocorre no Continente e sentir pelo homem maltratado é que esse espelho o
persegue implacável e o faz continuar
incansavelmente a escrever em terras do exílio, alerta nos seus 84 anos e ainda
acreditando no que escrevera em 1979: enquanto
haja banqueiros e assassinos, banqueiros e delatores, enquanto haja bombas de
neutron no ventre da África, cheia de tubarões e de banqueiros, residindo no
coração do sofrimento, não fiques jamais anestesiado, adormecido.
domingo, 3 de março de 1996
A resposta . 1
Claro, outras coisas mais importantes posso
dizer sobre a Revolução Cubana, mas não as digo em voz alta nem por escrito
porque ó os bobos se atrevem a explicar o amor. Eu não explico o amor: uso (ou
abuso?).
Em 1979, a revista Casa de las Américas, publicou nos seus números 111 e 112 a resposta de escritores à pergunta “o quê tem significado para você a Revolução
Cubana?” Entre os dezenove latino-americanos cuja resposta, em prosa ou em verso, apareceram no número 112, está Gabriel García Márquez.
Seu texto é muito breve.
Primeiro, ele remete à outra pergunta que lhe fora feita, à queima roupa, por
um amigo no México: Como seria você hoje
se a Revolução Cubana não tivesse sido feita? Lembra que, naquele momento, assustado, somente lhe ocorreu responder com uma boutade:
é impossível
saber como a gente seria se fosse crocodilo.
Só depois é que entendeu a
transformação que nele se havia operado a partir do momento em que deixou de
acreditar que o pleito milenário entre os
pobres e os ricos não iria se resolver com uma cíclica eleição
presidencial.

Esse entender, ele diz, o livrou
de ser não apenas um escritor cujos livros foram traduzidos para vinte e cinco
idiomas mas, certamente,o livrou, também, de ser embaixador de seu país, membro
de alguma Academia de Letras e quem sabe, presidente da República. Porque os encarregados de repartir essas
prebendas se cuidaram muito comigo porque minha solidariedade descarada e
teimosa com a Revolução Cubana me converteu numa espécie de delinqüente social,
perigoso embora inevitável (ou iniludível).
Ao receber, em 1982, o Prêmio
Nobel de Literatura, seu discurso diante da Academia Sueca, foi a prova mais
acabada do que dissera três anos antes.
Menciona o delírio áureo dos ibéricos, aportando no Continente e a
insanidade de muitos de seus governantes no tempo que se seguiu à independência
do domínio espanhol; relaciona a morte de crianças latino-americanas antes de
completar dois anos, os desaparecidos durante os regimes de exceção; as
crianças nascidas em prisões políticas que foram doadas clandestinamente e cujo
paradeiro as mães ainda ignoram; o exílio que depauperou quase todos os países
da América Latina; e reivindica o direito de empreender a utopia, uma nova e arrasadora utopia da vida onde
ninguém possa decidir por outros até a forma de morrer, onde, na verdade, seja
certo o amor e possível a felicidade e onde as estirpes condenadas a cem anos
de solidão tenham por fim e para sempre uma segunda oportunidade sobre a terra.
Um texto poético finalizando o
discurso, vago na expressão de sua esperança (e o amor e a felicidade) e
convicto de que tudo já esteja claro, presente quando proclama o direito à
liberdade e à vida.
Porque são poucos os que não
sabem que a vida e a liberdade no Continente (onde a submissão comanda os
decrépitos e ambiciosos governantes) estão sempre e continuamente ameaçadas.
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