Em 1973, a
Noguer de Barcelona publicou El hombre
que trasladaba las ciudades, um romance construído a partir das Crônicas
da Conquista da América. Carlos Droguett, sem se afastar da verdade histórica
contida nesse relato oficial, o refaz dando-lhe vida e criando uma das mais
perfeitas e belas obras da Literatura do Continente. Uma expressão rara, como
que feita somente de achados, um sapientíssimo uso dos recursos romanescos
fazem dessa obra um impressionante itinerário onde predominam linhas sinuosas
e repetitivas cujo avançar e recuar permitem seja vislumbrado o universo
desconhecido que os espanhóis cheios de sonhos e se perdendo no tempo quiseram
conquistar.
Uma vontade superior, regida
por altos e imensos interesses determinava-lhes a vinda para o Novo Mundo.
O rei da Espanha perseguia
as riquezas; a Igreja, dissimulando iguais desejos de posse, procurava adonar-se
das almas. Aos que nada tinham sobrava, igualmente, algum querer - um pedaço de
terra, algum ouro, uma aventura - e em busca dele atravessavam o Atlântico.
El hombre que trasladaba las ciudades é, também, a história dessa busca.
Juan Nuñez de Prado funda a
cidade de Barco e a cidade passa a lhe pertencer. Desfeita, reconstruída novamente
traçada e, novamente, aos pedaços, ele a vislumbra no futuro, mais bela,
povoada das mulheres que os soldados mandarão buscar e de muitas crianças, uma carreta cheia.
É um querer que seus
capitães endossam e que precisa ser, também, o querer dos homens que comanda.
Não são todos mais
aventureiros que soldados, não são todos
essa tropa de ladrões e assassinos que embarcaram na Espanha para conquistar a terra. Entre eles há os que sonham um mundo, os que acreditam ter
encontrado um espaço que lhes possa pertencer e, então, desejam criar raízes. São melancólicos, diz um dos capitães, se
apegam à terra, choram, olhando os jardins pisoteados pelos cavalos, se agarram
nas laranjeiras e juram e gritam e vociferam que jamais os abandonarão.
São os que vieram para ficar
e não querem seguir as razões que Juan Nuñez de Prado arranca de suas
angústias para determinar, em nome do rei e de Deus, que a cidade deve ser
mudada, mais uma vez, de lugar. Aqueles que, se admira, ainda, o capitão, não sabem abandonar virilmente uns vasos com
flores, uma dúzia de frutas perfumadas.
É o sentimento condenado, é
o querer condenado, como condenada está a cidade que, em ruínas, fica no
abandono, só habitada pelos mortos pendurados nas forcas.
Juan Nuñez de Prado
justifica: estamos construindo um mundo. Então, pouco significa para
ele, o desejo do outro, a vida dos homens que o acompanham na Conquista, os
seus próprios sofrimentos, as suas próprias dúvidas.
É o preço para realizar o sonho
que se inventou e que o Poder que lhe auferiram ou que ele mesmo se atribui
em nome de Deus e do rei, lhe permite pagar.
A conquista é uma bela febre, uma maravilhosa derrota, ele diz.
E, assim foi.
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