Carlos Fuentes é um dos
poucos latino-americanos que tem grande parte de sua obra traduzida para o português.
Evidentemente, isto se deve a que algumas delas foram publicadas em inúmeros
países e, como é sabido, as editoras do Terceiro Mundo se guiam, muitas vezes,
pelas listas dos mais vendidos em Nova Iorque o que, no seu entender, e no entender
da maioria dos leitores, é suficiente para significar qualidade.
Por ser filho de diplomata,
Carlos Fuentes passou os seus primeiros anos em diferentes países - inclusive
no Brasil - e, por opção pessoal, vários outros períodos fora do México.
Mas, assim como outros
escritores, que afastados por uma razão ou outra da América Latina, é nela,
todavia, que prendem as raízes de sua obra, Carlos Fuentes é, essencialmente,
ligado ao México. E, se, em La campaña
cabe a América inteira e em Gringo viejo
o personagem central é um norte-americano, isto não significa ter se afastado
de seu interesse primeiro - o México - e sim chegar a ele por outros caminhos.
Em “Constancia”, relato que
publicou juntamente com outros sob o título Constancia y otras novelas para vírgenes (México, Fondo de Cultura
Económica, 1990), o personagem narrador é um médico norte-americano. Quando
jovem fez estudos na Espanha de onde levou, ao voltar a seu país, uma andaluza,
Constancia, o motivo de suas emoções e razão de seu relato. Mas, entre o que lhe parece
necessário contar de seu relacionamento com ela ou com o imigrado russo, seu
vizinho - e, talvez o não menos importante, - ele procura também, se entender
ou se explicar a partir de seus compatriotas: Um país que adora comprovar que a Declaração da Independência tem
razão, que todos os homens são criados iguais e que esta igualdade [...]
significa o triunfo do mais baixo denominador comum.
Entre esse denominador, ele
se reconhece: Elegemos presidente a um
atrasado mental como Reagan para provar que todos os homens são iguais.
Preferimos nos reconhecer num ignorante que fala como nós, diz as mesmas
piadas, padece das mesmas amnésias, preconceitos, obsessões e distrações,
justificando nossa vulgaridade mental.
E torna a definir o
norte-americano como um povo nômade,
grosseiro, atarantado de cerveja e de televisão, incapaz de criar uma cozinha
própria, dependente da minoria negra
para dançar e para cantar, dependente de sua elite para falar além do grunhido.
Sem dúvida, dramático, ou
trágico, ou cômico, esse perfil de um povo que, nos nossos dias é o modelo tido
como único e definitivo para os países do Terceiro Mundo onde uma parcela da
população acredita que o que é bom para os norte-americanos é bom para todos.
Entre os poucos que não se
deixam iludir por essa pseudo verdade está Carlos Fuentes que, tampouco, ignora
a relação que o país do Norte estabelece com aqueles do Continente.
Na conhecida “Entrevista”
que ele concedeu a Emir Rodriguez Monegal, publicada no volume Homenaje a Carlos Fuentes (Madrid,
1971) ele já havia dito que o isolamento
chauvinista é algo que tanto as
próprias oligarquias quanto os círculos reacionários dos Estados Unidos tem um
grande interesse que seja mantido no Continente, pois, com ele continuarão o
atraso, o isolamento e a sua sujeição ao Grande-Irmão-do-Norte.
Certamente, “Constancia” é
um relato sobre o amor, sobre a solidão, sobre a morte e seus mistérios e, tudo
o mais que ele contenha seja secundário.
Secundário, talvez, mas
absolutamente necessário.
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