O obscuro na linguagem é um vestígio do
antigo servilismo. Pablo Neruda
Rodriguez Monegal no
capítulo XIII de Elviajero inmovil,
seu excelente livro sobre Pablo Neruda, comenta, dele destacando algumas
idéias, o discurso pronunciado pelo poeta no dia 26 de maio de 1953 quando foi
realizado em Santiago o Congresso Internacional da Cultura.
Falando para intelectuais
(entre eles Diego Rivera, Nicolás Guillén, Jorge Amado), Pablo Neruda enuncia
alguns de seus princípios estilísticos, iniciando suas palavras com uma citação
de Walt Whitman, o velho poeta americano cantor da democracia. Então, se refere
ao Canto general cujos poemas, quase
sempre, foram escritos em esconderijos onde Pablo Neruda se refugiava para
escapar da prisão que o governo contra ele decretara. No entanto, a sua maior
dificuldade, nesses momentos difíceis de fuga e isolamento, ele confessa, se
constituiu, sobretudo, na luta para alcançar a simplicidade e a clareza.
Porque, se a poesia, como o
pão, entre todos deve ser repartida e se os humildes do Continente não sabem
ler, a simplicidade passa a ser o primeiro dos deveres do poeta. Muito me custou sair da obscuridade para a
clareza porque a obscuridade verbal passou a
ser entre nós um privilégio de casta literária e os preconceitos de
classe consideram como plebéia a expressão popular e a simplicidade do canto, disse, então, no seu discurso. Embora
não tenha conseguido se libertar, totalmente do culto pela palavra - e o poema
“Mollusca gongoriana” é, sabidamente, disso a prova - esse desejo de que a
linguagem, sem deixar de ser poética, seja a do homem e não a de uma casta, é
plenamente alcançado no canto XVIII, quando ele dá voz aos homens do povo: o
sapateiro, o marinheiro, o pescador, o mineiro. São poemas límpidos,
transparentes que Neruda escreve, como claramente diz no poema “La
gran alegría” do canto XV, para esses
simples habitantes que pedem água e lua, elementos da ordem imutável / escolas, pão e vinho / guitarras e ferramentas.
Por esses homens Neruda
lutou no Senado e para eles declamou seus poemas. Foi escutado.
No seu livro de memórias Confieso que he vivido conta que em
Lota, cidade das minas de carvão, dez mil mineiros estavam reunidos na praça
para um comício político no qual ele também usaria da palavra. Quando chegou
sua vez e anunciaram seu nome, os dez mil mineiros, ao mesmo tempo, tiraram os
capacetes prestando-lhe assim uma homenagem espontânea, imensa. Uma expressão
de calada reverencia..
Ao dizer a seus pares, em
Santiago, quisera deixar bem claro que para os poetas, América e claridad devem ser uma só palavra, ele oferece uma preciosa e
norteadora lição da qual sua poesia é um exemplo.
Ser compreendido por aqueles
que deseja como centro de seus poemas e deles destinatários, também faz de
Pablo Neruda um poeta único. Ele não apenas se impregnou das vozes de seu povo,
como poetou para que esse mesmo povo se escutasse ao escutá-lo.

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