Ao se propor, em 1954, fazer
o paralelo entre a cultura brasileira e a cultura norte-americana, Vianna Moog
em Bandeirantes e pioneiros (Rio de
Janeiro, Civilização Brasileira, 1989, 17ª edição), estabelece como fatores
responsáveis pelo progresso dos Estados Unidos e o lentíssimo desenvolvimento
do Brasil, o relevo, o clima, a orografia, a hidrografia e as circunstâncias
históricas. Entre essas, o fato de nos Estados Unidos terem chegado povoadores
que desejavam fundar um novo país onde pudessem praticar, com liberdade, a sua
religião. Homens que chegavam para não retornar. Para o Brasil, ao contrário,
os homens, na sua grande maioria, vieram, somente, em busca de aventuras e
riquezas. Homens que jamais pensaram em criar raízes pois seu único desejo era
sempre o retorno ao velho país de origem.
Nessa ânsia de enriquecer -
sem valores éticos e morais a imporem fronteiras - e partir, estaria a explicação
para o sentido predatório que caracterizou, desde o início, a ocupação do solo
brasileiro.Um tipo de mentalidade que dominou não apenas o cotidiano de seus
habitantes mas, principalmente a administração pública do país.
Nem o governo, nem o cidadão
brasileiro temem o desperdício ou o desequilíbrio ambiental. Fazem uso das
riquezas que o país oferece, seja ela mineral, vegetal ou animal, sem pensar
nunca no futuro por mais próximo que ele possa estar.Os exemplos desse tipo de
comportamento são infindáveis e tão comprometedores que recentemente até
originaram matérias em publicações de circulação nacional.
No entanto, por mais que
seja conhecido esse esbanjamento cotidiano e constante, essa falta de visão do
futuro que leva somente a extrair o que existe sem que seja estabelecido um
compromisso em repor o que foi tirado, não deixa de ser estarrecedora a leitura
de Amazônia, a menina dos olhos do mundo
(Rio de Janeiro, Civilização Brasileira, 1991) que Thiago de Mello lançou
em Curitiba na primavera passada.Nas cifras imensas que o poeta cita,
inscreve-se a imensidão do território brasileiro e da inconsciência com a qual
é regido.São 300 mil hectares desmatados por ano na Serra dos Carajás. Exuberantes sucupiras, jatobás, ipês e
castanheiras são queimadas diariamente em fornos apelidados de rabo quente. Madeira nativa que deveria
ser replantada pelas empresas que participam do Projeto do Polo Metalúrgico,
autorizadas a produzir ferro gusa, ferro liga e silício metálico utilizando
carvão vegetal.
A reposição exigida em 25% a
partir do sexto ano de atividade da empresa e em 50% a partir do décimo ano,
além de insuficiente, não leva em conta os altos custos sociais e ambientais de
um desmatamento em tais proporções. E o fato do Projeto ser considerado por
alguns - os que decidem - tecnicamente e economicamente viável, não justifica,
mesmo em nome do progresso, o que nele impera de prejudicial e de predatório.
Predatória, igualmente,
alerta Thiago de Mello, é a ação do homem no Pantanal. Pecuaristas,
agricultores e coureiros, em poucos anos, causaram profundas e maléficas
transformações na região, originadas todas da cobiça e do egoísmo.
As barragens construídas
alteraram a rede fluvial: rios deixaram de ser navegáveis, outros tiveram seus
cursos desviados e bloqueados, provocando, evidentemente, desequilíbrios na
fauna e na flora com a mudança de periodicidade das cheias; as florestas
arrancadas das margens provocaram desbarrancamento e os agrotóxicos, usados sem
discriminação, envenenaram as águas dos rios; a matança constante de jacarés,
veados, onças, lontras, e capivaras está acabando com as espécies.
Riquezas que pertencem ao
país e que vão sendo destruídas em proveito de uns poucos capazes somente de
aspirar o lucro imediato, repetindo a lição predatória que se refaz a cada
geração de brasileiros.
Thiago de Mello, o grande
poeta de Estatutos do homem não
desdenhou da prosa para esclarecer e informar e o faz com a objetividade
daquele que sabe e quer transmitir esse conhecimento e com a força que só as
palavras amorosamente sinceras podem ter.
Amazônia, a menina dos olhos do mundo é um
brado de alerta e uma convocação
irrecusável para resistir ao que o poeta chama de sanha predatória dos novos bárbaros, diz Ênio Silveira, seu editor.
Uma convocação para os
realmente letrados, para os que se querem justos, para os sabiamente
conscientes de seu viver no mundo. E para os que sem hipocrisias se desejam
brasileiros.
E desses, algum dia a voz
será ouvida?

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