Livro de muitíssimas edições
e traduzido para o inglês, francês e espanhol, Bandeirantes e Pioneiros, cuja primeira edição data de 1954 (Porto
Alegre, Globo), é, perdoe-se o lugar comum, leitura obrigatória para todo
brasileiro que tenha um mínimo de interesse em procurar entender o seu país.
Vianna Moog, romancista (Um rio imita o Reno, Tóia) e ensaísta
gaúcho (Eça de Queirós e o século XIX,
Heróis da decadência, Uma interpretação da Literatura brasileira) em Bandeirantes e Pioneiros procurou
explicações que lhe esclarecessem porque o Brasil mesmo à luz das interpretações e profecias mais otimistas ainda se
apresenta apenas como o incerto país do futuro
enquanto que os Estados Unidos atingiu o impressionante e incontestável estágio
de desenvolvimento e liderança conhecidos. Questão que havia sempre resultado
numa resposta que, aliás, explica, na opinião de muitos, grande parte, quando
não todos, os males brasileiros: a qualidade dos povoadores do Brasil.
Simplista demais, foi uma
resposta que pareceu satisfazer grande parte de várias gerações da elite
brasileira o que não impediu, no entanto, que a pergunta continuasse a
perseguir essa elite com a persistência
de leit-motives obrigatórios e indesviáveis.
Hoje, trinta e oito anos
passados da primeira edição de Bandeirantes
e Pioneiros, além das enunciadas pelo ensaísta gaúcho - a orografia, a
hidrografia, o clima, o relevo e os antecedentes históricos - outras
explicações podem, ainda, ser levadas em conta. E entre elas, irá sobressair a
absoluta falta de valores morais que predomina no país. É quando emerge do
passado a figura do mazombo, evocada em Vianna Moog ao considerar os
antecedentes históricos das duas culturas que analisa.
Antecedentes históricos que
explicariam o sentido orgânico da formação americana e o sentido predatório da
formação brasileira, assim como explicariam o ser americano e o ser mazombo.
Vindo para a América em
busca de um espaço onde praticar livremente o seu culto religioso, os primeiros
povoadores dos Estados Unidos trouxeram a família, seus valores morais, éticos
e culturais e o desejo de estabelecer uma comunidade regida por leis que se
ajustassem ao bem comum.
Os primeiros ibéricos que
chegaram ao Continente - e durante muitos anos assim foi - ao contrário, vieram
sós, em busca de riquezas e aventuras e, sempre com o intuito de regressar para
a família e para a vida em Portugal; desprovidos da vontade de possuir as
terras e nelas realizar o seu futuro não traziam com eles nem espírito público,
nem virtudes econômicas, somente a inesgotável ânsia de enriquecer.
Assim, enquanto o pioneiro
nos Estados Unidos conquista a nova terra palmo a palmo e funda vilas e
cidades, o português se adentra no território exclusivamente para dele tirar as
riquezas mesmo a custo dos mais cruéis e irracionais atos predatórios.
Conseqüente e natural foi,
então, que dos pioneiros que chegaram ao hemisfério norte, voltando as costas
para a Europa e desejosos de fundar um país, resultassem os americanos que
assim era como se chamavam e como queriam ser; que dos colonizadores portuguêses,
resultassem os mazombos filhos dos
portuguêses, nascidos no Brasil,
categoria social à parte, a que ninguém queria pertencer.
Se o termo pejorativo, hoje
sinônimo de sorumbático, macambuzio, malhumorado, acabou por cair em desuso, o
personagem que lhe deu origem, no entanto, permaneceu. Diz Vianna Moog que ainda
no fim do século passado o Brasil
pululava de mazombos. Aqueles que, exatamente, como nos tempos coloniais,
não desejavam ser brasileiros, não possuíam interesse ou gosto por qualquer
tipo de atividade orgânica, nem iniciativa, nem criatividade. Somente, um
grande descaso por tudo quanto não oferecesse oportunidade de fortuna fácil, de
obtenção de privilégios ou sinecuras propiciadoras de riquezas adquiridas sem
trabalho.
E eis que agora, no fim
deste século, em que mais acentuadas resultam as diferenças de desenvolvimento
entre os dois países, não é difícil encontrar na sociedade brasileira,
descendentes desses mazombos de antanho.Hoje, ele se denomina brasileiro e até
pode sê-lo de várias gerações, mas, fielmente, como se o tempo não houvesse
passado, continua sendo o estrangeiro predador extraviado em terras brasileiras. Como o mazombo dos tempos da
colônia ele lisonjeia, transige, corrompe, revolve céus e terras quando se
trata de seus próprios interesses. E etc.

Nenhum comentário:
Postar um comentário