Na
ficção do narrador uruguaio, os animais lhe imitam os gestos, as certezas e as
palavras. Há a donzela inocente, aquele que a defende e o que persegue o
defensor. Uma história triste que tristemente, acaba. Porém, na tragédia das
injustiças ( e mortes e lágrimas), Francisco Espínola insere a burla. Uma burla
sem inocência porque se cristaliza, sobretudo, na figura do delegado e de suas
andanças em busca do fugitivo.
Descrevendo,
minuciosamente, o seu despertar de ser humano – o valente tigre-delegado desse
universo de animais, estira os braços de sob as cobertas, se espreguiça,
boceja, abre os olhos – e seus gestos
para sair da cama e para se vestir,
Francisco Espínola inicia a desmistificação da autoridade. Desmistificação que
irá continuar diante da explicação desse diário mau humor do delegado: Havia contrabandeado muito. Por isso mesmo
sempre andava de lua. Ele sem querer, sem
perceber bem a causa, ao pressentir milicos se enfurecia. E, também, diante
de seus sucessos profissionais, perseguindo faltosos campo afora. O que faz
metido numa esplendorosa jaqueta de gala desde que seu ajudante de ordens lhe
queimara a jaqueta de serviço e com medo das conseqüências, montara a cavalo e
fugira para o Brasil. Mas, é no capítulo VII que El Tigre e seus milicos em
ação, se mostram, verdadeiramente, caricaturais. O personagem a quem buscam
prender os precedera e há muito tempo – o suficiente para atrair a simpatia dos
freqüentadores habituais – já estava no botequim. Quando o delegado chega, o
soldado que ele havia enviado para dar a pista do perseguido, já havia sido
desarmado e preso. Também, já fora convencido “pelos outros” de que ser soldado
é a última coisa que pode acontecer a alguém e havia mudado de bando. Mas,
El Tigre ainda não sabia disso e, confiante, entra na venda. Começa a desarmar
os presentes, enquanto lá fora, a
sentinela que deixara, fora rendida e seu cavalo e os de seus homens,
soltos, corriam em disparada. Nem chega a tirar as armas de todos, quando, por
sua vez, é rendido pela sentinela dos outros e encerrado num quarto com janelas
gradeadas. Preso como um rato e, esbravejando, ele ficou vendo partir, a
galope, os fora de lei.
Na
longa seqüência narrativa que dá conta desse enfrentamento entre o delegado e
aquele a quem persegue, a troça é uma constante e se prende, quase sempre, aos
tipos e as suas reações.
Profundamente
ingênuo e com seus atos, muitas vezes, presos nas próprias intenções, sem limite é a admiração do delegado diante de
seu fracasso e das armas que lhe são apontadas: Que escândalo! Olha as coisas
que a gente tem que passar na vida!, ele exclama com as mãos para o alto.
Ilimitada,
também, será a sua necessidade de vingança. O riso que provoca no capítulo VII,
El Tigre fará pagar bem caro. Com um tiro de revólver ele mata, no capítulo X,
a boa e inocente donzela Mulita. Então, o
parêntese do riso se fecha em Don Juan el zorro (Montevidéu, Arca,
1984).

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