Patas de perro é uma delas. Em espanhol,
foi publicada em 1965. Traduzida para o francês, apareceu em 1981 pela Denoël
de Paris. Tanto pela crueza de seu argumento quanto à forma como se estrutura a
narrativa, se constituiu um momento muito especial não apenas na Literatura
Chilena contemporânea como na Literatura do Continente latino-americano.
Patas
de perro é a história de um ser extraordinariamente
anormal onde se unem o corpo de um belo menino e umas belas patas de cão. É claro que ele não era um menino disforme,
não, seu corpo era firme e esbelto, delgado e duro, quase atlético, apesar de
se alimentar tão mal, e suas pernas eram um par de soberbas patas de cão,
robustas e orgulhosas, eretas e quase feras, e na criatura se juntavam de um
jeito tão natural que parecia que ele nascera de uma geração muito antiga e
refinada, de uma maravilhosa família de
seres humanos com patas de cão.
Um “monstro horrível, “um belo menino, “um cão
horrível”. A existência de Bobi pode ser questionada, inclusive a partir das
palavras do narrador: alguns dizem que estou ficando louco e que o menino nunca existiu.
Inquestionável, no entanto, é a
violência sofrida pelo menino-cão. A figura de Bobi é fruto d e uma fantasia
agressiva e bastaria para empalidecer toda a realidade ficcional que o
encarcera. Porque, não sendo como os outros, a sua história é uma história de múltiplas vexações: ora ele
é exibido como um monstro numa vitrina, ora jogado no chão com as mãos
amarradas, ora preso num leito de hospital ou entre as grades de um canil.
Situações
que, na verdade – abstraindo-se a comovente figura do menino cão – com maiores
ou menores semelhanças, fazem parte do cotidiano do Continente.
Desde
o início de sua carreira, Carlos Droguett se atribuiu a missão de delatar as humilhações de que o homem é vítima. Aqueles que lhe
conhecem a obra não ignoram, porém, a profundidade com que ela
se enraíza no real. E, ancorada na realidade, o mundo de Patas de perro, queiramos ou não, é o mundo dos latino-americanos.

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