Em
1941, morria Pedro Aguirre Cerda, Presidente chileno cuja eleição havia trazido
muitas esperanças para os grupos menos favorecidos. Sua morte, ocorrida antes
de que pudesse efetuar algo de significativo, representou para os seus seguidores uma grande perda.
Ramón Neiva, pedreiro, bêbado nas horas vagas, órfão de pai assassinado pelo
polícia, sente com essa morte uma nova orfandade. Nas lembranças encharcadas de
vinho, o velhinho negro como afetivamente se refere a ele, apresenta-se como
figura paterna, visão de sonhos e alucinações. Viu pela primeira vez, a mulher a quem amou, no enterro do
Presidente, e em sua honra deu o nome de
Pedro ao filho que nasceu. E é na lembrança do Presidente que se refugia nos
momentos de tristeza.
Figura
principal do romance de El Compadre
de Carlos Droguett, publicado pela primeira vez pela Joaquín Mortiz do México,
em 1967, Ramón Neiva expressa num fluir da consciência (permita-se a expressão)
os sentimentos da maioria dos habitantes do Continente: o desamparo diante de
uma vida que as estruturas socias marginalizam e a busca de um protetor que
minimize essa marginalização.
No
desamparo e no vazio, Ramón Neiva procura, pelo menos, um amigo. Embriagado,
vai achá-lo na figura de uma imagem na Igreja onde entra em busca de paz e da
felicidade que lhe escapara das mãos. Diante da imagem de São Judas Tadeu,
procura forças para largar a bebida. Mas, o cotidiano nos andaimes, ao sol e ao
vento, a realidade que encontra ao descer, a mulher que dele se afasta cada vez
mais só o induzem à beber. E o Santo,
tranqüilo na penumbra da Igreja, permanece em silêncio, ignorando as dúvidas do
homem. Ramón Neiva ao vê-lo com o rosto
tranqüilo [...], os olhos perdendo-se
docemente, sem pressa, no céu, ignorando a terra, pensava que não tem graça ser santo quando não se foi capaz de odiar alguém, de amar furiosamente
alguém. Para comover o Santo, para forçá-lo a condescender em baixar os
olhos para ele, pobre bêbado, Ramón
Neiva, pedreiro qualificado, promete
deixar de beber. Em troca, quer que o Santo seja o padrinho de seu filho. Os
dias, porém, passam iguais: dominado pelo trabalho em cima do andaime, pelas
lembranças, pelos delírios da bebida. Ele não cumpre o prometido ao Santo,
sempre com o seu sorriso feliz e seus
olhos alçados para o céu. . Precisa, porém, de sua
anuência para se justificar. Então, acredita ter escutado as palavras do santo
quando dormia, embriagado, a sus pés: Vai,
compadre, bebe! O vinho é bom.
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