Designado pelo Vice-rei do
Peru para fundar uma cidade, Juan Núñez de Prado com os homens que pode reunir,
percorreu um extenso itinerário durante o qual enfrentou discórdias e lutas e
toda sorte de desventuras. Carlos Droguett, sem se afastar da história oficial,
relatada nas Crônicas da Conquista, refaz esse caminho em El
hombre que trasladaba
las ciudades
(Barcelona, Noguer, 1973), um dos mais belos e perfeitos romances
latino-americanos. No segundo capítulo, o capitão e seus homens avançam no
Continente em pós de um sítio para assentar, pela segunda vez, a cidade.
O vice-rei do
Peru, padre La Gasca, ao ordenar que Juan Núñez de Prado organize uma expedição
para, internando-se no Continente, fundar uma cidade, não lhe propicia ouro,
nem cavalos. Tampouco soldados. Não tens
bandidos e assaltantes aqui? procura famintos sem entranhas, leva contigo cárcere e encarcerados Foram duzentos os
que partiram e, além dos capitães, poucos são aqueles que, no segundo capítulo,
são identificados por seus nomes. Quando Juan Núñez de Prado, se dando conta de
que não poderia levar todas as cadeiras que estavam atiradas no chão, chama
Bautista, Alcántara, Rentería e Griego; num de seus delírios, se imagina doente,
ferido ou que soldados tenham se revoltado, e os nomeia: Sebastián Mateos,
Santos Velásquez, Cristóbal Pereira. Ao ter dúvidas sobre o lugar que
escolheram para, pela segunda vez, assentar a cidade, Juan Núñez de Prado olha
com ira para Rentería, Antonio Griego, Juan de Humarán que afirmam ser aquele
onde pararam, obrigados pela chuva, um bom lugar. Por vezes, é o narrador quem
menciona os soldados, conhecendo-lhes as intenções e identificando-os pelo nome:
Humarán, indiferente aos destroços da cidade
feita e desfeita e aceitando a sua mudança, disposto a levá-la para os cerros, a costa, os bosques, as
montanhas, perto dos rios, porque a sua casa, o seu caminho era o cavalo e
por ele seria conduzido a outras cidades, a outras aventuras. Diego Griego, o
único a receber menção sobre o seu físico (belo rosto, olhos negros, cabelo
revolto), que estava armado e com a espada na mão, queria se enfurecer logo
para perseguir índios e prisioneiros amarrados. Diz que a mudança já deveria
ter sido feita (já vês que estamos indo embora tarde) e por isso seria, mais
dolorosa e motivo para que centenas fossem mortos. Diante da decisão da mudança
-Vamos embora, senhores diz o capitão
Santa Cruz, querendo demonstrar que o estimava e continuava sendo seu amigo lhe
sorri. Com o arcabuz sobre os joelhos, incapaz de segurar as rédeas do cavalo,
de apertar-lhe a cincha, tremia um pouco, dando a impressão de que, se o cavalo
saísse a trote, ele se desvaneceria.
Também em
outras seqüências, aparecerão os nomes de Humarán e Antonio Griego. No episódio
em que Juan Núñez de Prado mata um soldado, Humarán se mostra irritado porque
pretendia estar, dentro de quinze dias em Santiago para negociar a mina que
possuía, perto do rio; Antonio Griego apeia do cavalo com muito barulho e
aparato para que se soubesse quem ele era. Ou, em outro episódio, quando em
meio à desordem e à loucura da cidade que estava sendo desfeita, eles riam
contentes.Ou, ainda, naquele em que o padre Carvajal chega na cidade, imersa no
movimento de construção e destruição e os reencontra junto com Valdenebro. Eles
se aproximam dele através de seus
sorrisos e do brilho delgado de suas almas. Ao caminhar, à noite, vai
cumprimentando: olá Rodrigo, como vai Sacramento, boa noite, bom dia Diego e
escuta os soldados pedirem ferramentas: dom Álvaro, passe as tenazes, mais
pregos, o serrote.
Dois nomes
ainda aparecem referidos no segundo capítulo. O do soldado Bruselas que dom
Francisco, capitão a soldo de Pedro de Valdívia, do Chile, afirma ter sido
assassinado por Juan Núñez de Prado, pelas costas. E o do prisioneiro que,
empurrado, caminhando como bêbado, parou
para buscar rostos conhecidos. Diz-lhes os nomes: Romero, Alonso Romero, deixa que eu te explique, Griego, Antonio Griego, meu amigo. O que deseja explicar
o relato não diz como, tampouco, quem foram os que, depois de ele ter dito o
próprio nome, Sou Ginés Herrera, o
golpearam no rosto.
Carlos
Droguett, ao reescrever a história do ato colonizador no Continente,
identificando ou não esses soldados que o tornaram possível, em algumas
expressões ou em algumas frases lhes fixa a presença. Uma imprescindível
presença que a crônica oficial fez constar em números, em datas, em atos onde
eles se diluem. Imaginando-os em meio a emoções, em meio a gestos e à
vulnerabilidade de seu destino, o romancista chileno com seu talento e o
compromisso que sempre assumiu com o homem, torna essa presença verdadeira e
comovente.

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