domingo, 14 de maio de 2006

Perversos descaminhos


O petróleo, agora, parece ser nosso como decanta uma eufórica e entusiasta mensagem do governo. No entanto, não são muitos os que sabem das inimagináveis desgraças e perversos malogros acontecidos, ao longo dos anos, em que a existência de petróleo no Brasil era negada e a sua exploração proibida. Ou das tragédias e dos dramas que atingiram os que afrontaram tais assertivas e tais proibições.


            No capítulo “Os primeiros mártires do petróleo" de O escândalo do petróleo (Brasiliense, quinta edição, em 1951), Monteiro Lobato lembra três deles. José Bach, de nacionalidade alemã, estudou, durante treze anos o litoral de Alagoas e desse estudo se originou a certeza de que era imensa a riqueza de petróleo na região. No dia 26 de agosto de 1918, sentindo-se, talvez, ameaçado, escreve ao Chefe de Polícia de Alagoas, pedindo proteção. Poucos dias depois morre afogado. Ao cruzar  um braço da lagoa, o canoeiro não era o mesmo que sempre o levava: “a embarcação revira e o pobre sábio perece. O canoeiro limitou-se a um banho.

            Pinto Martins, sócio de um senhor de Maceió, que havia adquirido da viúva de Jose Bach os seus estudos e direitos, viaja para Londres e Nova Iorque. De volta ao Rio de Janeiro, telegrafa para o sócio, informando que havia fechado negócio e que assinaria o contrato em três dias. Suicida-se, antes disso, num quarto de hotel, sem que ninguém compreendesse semelhante tragédia [...]. A sua papelada – mapas, relatórios e mais estudos de José Bach – desapareceu do hotel....

            Barzaretti, engenheiro italiano, realizou pesquisas em Mato Grosso. Anuncia que há petróleo no Pantanal e que pretende explorá-lo. Súbito, em Campo Grande, uma bala o pega. Tiro mortal. E de bons efeitos práticos: ninguém mais falou no petróleo mato-grossense.

            A este capítulo, segue-se a “Carta aberta ao Ministro da Agricultura” em que Monteiro Lobato relembra ter escrito um ano antes, uma carta ao Presidente da República em que denunciava a sabotagem sistemática contra o petróleo brasileiro, feita pelo órgão governamental que dele deveria se encarregar. Tendo em vista que nenhuma providência havia sido tomada, explica, decidiu repeti-la como prefácio do livro A luta pelo petróleo de Essad Bey. Como o seu texto teve uma enorme repercussão – muitos jornais o reproduziram – o órgão mencionado se obrigou a fazer um comunicado aos jornais, referindo-se às acusações aleivosas, formuladas por aventureiros de má . Monteiro Lobato reconhece que tal epíteto lhe é dirigido tanto quanto aos heróicos pioneiros que à frente das companhias nacionais procuravam, com tremendo esforço, dar petróleo ao Brasil e se dispõe a fundamentar a sua assertiva de que os aventureiros de má fé, na verdade, eram aqueles que atuavam no Departamento Nacional de Produção Mineral: um órgão de enorme custo para o país. Regido por uma figura decorativa, seus técnicos exerciam, apenas funções burocráticas e suas principais figuras eram o diretor da Geofísica e o diretor de Geologia. Um, o detentor em primeira mão dos resultados dos estudos geofísicos e o outro é o detentor, em primeira mão dos estudos geológicos, isto é, dispõem, sempre, em primeira mão de todos os segredos do sub-solo nacional, revelados pela Geofísica e pela Geologia. Porém, mais estarrecedor, ainda, é a menção de Monteiro Lobato de que, além de serem estrangeiros e exercerem funções no Departamento Nacional de Produção Mineral, esses dois diretores, criaram uma firma comercial para uso externo, a Malamphy & Oppenheim. Oferecem, em revistas estrangeiras, serviços profissionais para os que pretendem se apossar das terras petrolíferas brasileiras, dando, inclusive, como prova de integridade  serem membros de institutos norte-americanos.

            Todavia, nem tais fatos, nem os demais, igualmente graves, que Monteiro Lobato foi denunciando, durante anos, receberam outra reação por parte do governo brasileiro que não fosse a de se mostrar  vilipendiado, vítima de falsas acusações e, portanto, no direito de instituir um processo contra o seu detrator, visando a sua punição. Uma punição que, verdadeiramente, ocorreu  embora baseada em tortuosas vias, pois Monteiro Lobato acabou sendo preso. Na cadeia, ainda escreveu uma carta ao Presidente da República. Datada de 19 de abril, inicia, dizendo que está a lhe mandar um presente de aniversário: a idéia de fundar a Companhia Nacional do Petróleo.

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