
Entre os
poemas, “Seis fotografias de Pablo Neruda”, de Nicolau Baião, surpreende pelo
inusitado ao descrever, aparentemente em prosa,
fotos do Poeta. São frases curtas
que, em seis tempos, traçam uma biografia feita de emoções presumidas
por aquele que tem diante de si as fotos que imagina. Assim, embora haja um
registro de tempo ( o Poeta aos três anos e aos seis, já adolescente, aos vinte
e três anos, depois, adulto), e de espaço ( sala de aula, uma praça de
Santiago, uma sala), e a menção às
pessoas com as quais ele está ou que o rodeiam ( o pai, o professor, uma jovem
colega, os passantes, César Vallejo), e a um detalhe de seu traje (veste uma camisa branca de pregas) ou de seu cabelo (o cabelo é um pouco revolto, como se lhe
tivesse dado um brisa indiscreta e
prazenteira) a comporem a imagem, o
que Nicolau Saião quer fixar é o sentir do Poeta na sua relação com o mundo.
Um sentir vislumbrando no olhar ou num
gesto, numa expressão. Na “Primeira foto”, a expressão ansiosa do menino de três anos,
sua mão como que “enclavinhada na fímbria do casaco de seu progenitor. Nas
demais, presentes, no olhar, o susto, algo de inquietação, serenidade e decisão. Já adulto, mostra no rosto uma ricto intraduzível, um claro sofrimento. Como o
narrador ficcional que tudo conhece de seu personagem, Nicolau Saião ou sabe ou
presume saber mais do que a foto deixa ver. Então, os limites da realidade e da
invenção se esbatem. Há nomes de pessoas, de lugares e de livros; há suposições
e dados improváveis nas afirmações desse falante, presente no texto, que se
deixa ver na autoridade de uma primeira pessoa do plural ( podemos imaginar), e no
ater-se ao que, em princípio, pode ser do conhecimento de todos ( entende-se, percebe-se) ou ao que
ninguém ignora (é sabido) para, nessa cumplicidade, delinear o poeta
chileno, menos na sua imagem do que nos seus momentos vividos. E’quando se mostra irrelevante rastrear o
falso e o verdadeiro nesse dizer poético
de Nicolau Baião.
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