La fiesta del chivo, o longo romance de Vargas Llosa, publicado pela Alfaguara no ano
2000, nesse mesmo ano apareceu no Brasil numa edição da Mandarim de São Paulo.
Trata-se de uma narrativa sem surpresas embora o romancista peruano use o
recurso de construí-la em três tempos. Num deles, o relato é centrado na figura
de Urania, dominicana que volta a seu país por um tempo muito breve e vai
relembrando o seu passado nessa caminhada que faz pelas ruas da cidade até a
casa do pai com quem se reencontra após trinta anos de silêncio. No outro, o
relato se ocupa do último dia de Rafael Leônidas Trujillo Molina, desde o seu
despertar, pontualíssimo, às três e cinqüenta até o derradeiro gesto, tentando
se defender quando uma ráfaga de metralhadora o atinge no meio do percurso para
San Cristobal. No terceiro, trata-se da espera pelo carro de Trujillo no
trajeto conhecido por aqueles que planejaram o atentado que lhe tirou a vida.
Igualmente
sem surpresas é o seu texto que se presta, então, facilmente, à reprodução em
outro idioma. No entanto, comparando o texto original com o seu correspondente
em português, notam-se vários tipos de desvios que não foram condicionados pela estrutura lingüística de um ou outro
texto: mudança de tempos verbais,
acréscimos ou substituições de palavras, eliminações de outras. No caso das
eliminações de palavras, na verdade, elas não sobressaem pelo seu número - no
primeiro capítulo, bastante restrito – mas pelo fato de não deixar de ser
curioso que palavras sejam eliminadas, ocasionando mudanças de sentido, sem que
haja um motivo plausível para isso. Assim, ao registrar os odores que
impressionam Urania ao caminhar pelas ruas da cidade, o texto espanhol fala de un aroma denso, indefinible, tropical, a resinas y matorrales en decomposición. Esta última expressão,
sendo eliminada do texto português faz
do aroma algo de agradável o que parece não ter sido a intenção do autor ao
usar a expressão en decomposición. Na mesma seqüência, onde o texto espanhol
registra que chisporrotean dos sartenes, o texto português elimina a
precisão do original ao registrar crepitam
frigideiras que pode, ser, nesse
plural, muito mais do que duas. Mais adiante, quando Urânia se interroga sobre
essa opção de voltar à ilha depois de
ter jurado nunca mais nela por os pés, a frase em espanhol diz que ela
quer provar a si mesma poder caminar por las calles de esta ciudad que ya no es suya. Em português, foi
eliminado o advérbio já ( andar
pelas ruas desta cidade ) e com
isso, levando à mudança de sentido pois
no original a cidade foi de Urânia e não é mais o que é diferente de não ser
sua cidade e nunca ter sido.
Como
em vários outros casos do primeiro capitulo,
essas eliminações aparentemente, se constituem breves falhas que não
chegam a distorcer, em profundidade, o sentido primeiro do texto. São, no entanto, dignas de nota por
se mostrarem gratuitas. E, aliadas às eliminações
e, sobretudo, às substituições de
palavras, se constituem inaceitáveis
opções diante do texto que, expressão do
autor, assim, deve ser respeitado.
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