domingo, 18 de março de 2001

Os ignorados

            Ele é um dos que foi apenas mencionado nas obras que tratam da Literatura Brasileira. Mas, nem sempre. Lauro Palhano, pseudônimo de Juvêncio Lopes da Silva Campos, surge na Literatura com o romance O gororoba: cenas da vida proletária no Brasil, publicado em 1931 que, no dizer de José Ramos Tinhorão, é um dos livros que antecipa o romance social. No prefácio do seu romance, o autor afirma sua vocação de escritor-trabalhador que, até então, só manejara martelos o quê lhe permitiria mostrar aos marechais da Fortuna, aos que governam, que legislam, que defendem as leis, o que é ser partícula dessa grande massa, em constante fluxo e refluxo para um lar de incertezas e de apreensões.

            Na verdade, abstraindo, nos dias atuais, as submissões à mídia que, em pouco tempo e quase sempre sem razão, faz de um livro um estrondoso sucesso, é sempre um mistério pleno de nuanças a receptividade a uma obra literária e os critérios que a podem tornar conhecida, respeitada, admirada ou fazer com que seja relegada ao olvido.

            Assim, o ter Lauro Palhano ficado esquecido poderá ser explicado muito simplesmente. Por exemplo, ter vindo à luz em meio a indiferença de uma elite pernóstica, sempre voltada para o Hemisfério Norte e, pretensiosamente, alheia às classes populares, como se elas não lhe dissessem respeito e que, portanto, não deseja encontrar nas suas leituras; ou a própria condição do escritor, indigno de respeito devido ao trabalho que exercia e a sua cor. 

            No capítulo em que estuda o romance social no Brasil, José Ramos Tinhorão, no seu livro A música popular no romance brasileiro, vol.II: século XX (1ª  parte), faz uma análise não somente de O gororoba, mas,também de Marupiara, uma saga da exploração da Amazônia e  de Paracoera, romance do Rio São Francisco e da gente ribeirinha. Uma análise que, embora presa ao tema primeiro de seu trabalho, se amplia em observações, oportunas valorizações dessas obras que, salvo melhor juízo,  não têm porque merecer uma indiferença, certamente, calcada em (más)  idéias feitas.

            Quando José Ramos Tinhorão nota que, numa  página de O gororoba, a saborosa descrição do clima pré-carnavalesco de Belém do início do século XX, já não aparecem as referências cheias de preconceitos ao modo de ser e de se expressar do povo, como tampouco aparecem figuras elaboradas a partir de concepções elitistas a mostrar a distância entre o escritor e as classes mais humildes, ele, com certeza, permite, mais uma vez, constatar – o que não deixa de ser conhecido – o quanto dessa característica da ficção brasileira poucos romancistas estão isentos. Também, leva a perceber o evidente posicionamento crítico de muitos que se ocupam da Literatura Brasileira ao optarem por ignorar autores – e é o caso de Lauro Palhano – cujos temas, no seu entender, possam se revelar parcos de interesse para um leitor que despreza o homem do povo. Até porque, ele pode se constituir um espelho no qual esse mesmo leitor não admite se ver refletido.

            O estudo de José Ramos Tinhorão, além das informações sobre a música popular na ficção brasileira, contém importantes motivos para induzir ao conhecimento de autores jamais estudados, em aproximações já libertas de parâmetros ultrapassados e que permitam uma visão mais abrangente do que é essa Literatura nacional que, a não ser pelas sempre raras exceções, é delineada por uma História Literária tradicional, por uma crítica sem profundidade e por uma Cátedra universitária repetitiva. Mas, dificilmente, e é de praxe,  são abandonados os caminhos percorridos. Até porque, os  perigos de enfrentar riscos são bem menores.

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