A
realidade latino-americana – certamente
muitos já o disseram – sempre se mostrou mais fantástica do que a ficção nesses
desvarios de injustiças em nome de antigas verdades, nessa perpétua violência
do relacionamento entre as classes, nessa fome e nessa doença, nesse
analfabetismo jamais erradicado. Realidade que parece fadada a uma vergonhosa
permanência a qual nada e ninguém deve ficar alheio porque, evidente mente, ela
não é da responsabilidade, apenas, dos dirigentes do país. Mas de todos e
sempre. Assim, também, a criação literária.
Com
base nesse pressuposto, aquele que analisa um texto a partir de modas importadas do Hemisfério Norte, considerando
apenas o seu aspecto formal, está muito próximo do estudioso medievo, a
discutir, entre quatro paredes, conceitos abstratos, enquanto a fome e a peste
dizimam populações. Se tal posição não se apresenta válida mesmo para aqueles
cuja nacionalidade lhes permite viver sem presenciar a miséria e a opressão do
indivíduo, no que se refere aos estudiosos latino-americanos, para quem a
miséria e a opressão se constituem espetáculos cotidianos, ela é inaceitável.
Fugir a opções estereotipadas (muitas vezes, lúdicas), que é a escolha de
tantos estudiosos da Literatura (abstraindo-se as sempre honrosas exceções),
significa, no entanto, enfrentar a mais difícil das posições: a de assumir a
realidade vigente, feita da entrega, gradativa, das riquezas do país aos
interesses estrangeiros, da posse ilegítima da terra, das disformes estruturas sociais, do alijamento
do saber. Da fome.
Daí
não se limitar o embasamento teórico para uma aproximação do texto,
comprometida, também com o seu contexto a um único modelo
literário/lingüístico, mas a todo aquele, inclusive o de outras áreas do
conhecimento, que permita entendê-lo de maneira mais ampla e completa, embora,
muitas vezes, ou quase sempre, no Continente, apenas seja possível a
micro-análise: a única forma possível de trabalho quando a bibliografia
especifica não está ao alcance da consulta e a imigração cultural para os
países detentores de material bibliográfico necessário não se constitui meta
prioritária. O imprescindível será sempre – e obrigatória a linguagem clara que
permita a compreensão mesmo para os não iniciados – possibilitar perceber os
mecanismos de dominação que a, assim dita, elite do país, pugna por manter
indecifráveis.
Na
verdade, mostra-se muito simples o fio condutor que rege tal posicionamento
crítico: a
chamar democráticos os regimes que a governam –, regidas por boas
consciências que se auto/ou interjustificam, repetindo-se através de gerações,
reafirmando privilégios e desfavores, os textos elaborados no compromisso com o
ser humano (e no Continente não são poucos) merecem, exigem uma aproximação que
lhes retome o sentido primeiro e não aquela regida por um palavreado inútil e
alienante.
convicção de que, se a América Latina segue o seu caminho de violência e tiranias – ainda não é possível
convicção de que, se a América Latina segue o seu caminho de violência e tiranias – ainda não é possível
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