Inca
Garcilaso de la Vega nasceu no dia 12 de abril
de 1529, filho de um ilustre capitão espanhol e de uma princesa incaica.
Daí, ter sido o quechua a sua língua materna e, também, desde muito pequeno ter
aprendido a manejar os fios trançados e coloridos dos “quipus”, a maneira de
contar dos incas. Esses fios eram de uma, duas, três ou mais cores porque, tanto
as simples como as misturadas, tinham todas o seu significado: para o ouro, o
amarelo; para a prata, o branco; para os guerreiros, o vermelho. E os nós eram
dados pela sua ordem de unidade (dezena, centena, milhar) e cada um deles e
cada fio iam emparelhados uns com os outros e nesse tecer emergia a vida
inteira da comunidade: a sua produção agrícola, o número e condição de seus habitantes, a quantidade das
armas disponíveis. Um sistema contábil que assim como as leis e a religião, os
usos e costumes dos incas traz no seu
bojo toda uma visão de mundo que os colonizadores ibéricos desconheciam e
que Inca Garcilaso de la Vega na sua
obra faz conhecer.
Assim,
nos Comentarios reales, ao tratar
dos “quipus”, ele se refere, também, aos “quipucamayu”, aqueles que são
encarregados das contas do Estado. Mencioná-los, o conduz a uma breve digressão
sobre a índole dos índios de seu tempo que, pela pouca malícia que demonstravam
e pelo modo como se comportavam, poderiam, no seu entender, ser
considerados pessoas de bem. Para
exercer o ofício de “quipucamayu”, no entanto, deveriam, ainda, demonstrar uma
longa prática da bondade. Mas, a prudência dos incas ia além: embora fossem os
escolhidos homens fiéis e honestos, cada comunidade, por pequena que fosse,
possuía, no mínimo, quatro “quipucamayu”. Como os vinte ou trinta das
comunidades maiores eles mantinham o mesmo registro de tudo o que ocorria,
pois, dessa maneira não haveria meio de
falseá-lo. Eram práticas que originavam uma confiança da qual eles faziam jus.
Na verdade, depositários da história de seus antepassados, das leis e dos
ritos, das cerimônias e dos impostos, estudavam continuamente os sinais e as
cifras que os nós e as cores dos “quipus” transmitiam e estavam aptos a
responder as perguntas formuladas, sem se afastar da verdade. Com a chegada dos
ibéricos, se deram conta, porém, que existia a traição e a hipocrisia.
Compreenderam que o sentido do que eles faziam ou os atos que praticavam, na
maior parte das vezes, não obedecia aquilo que era antes estipulado mas,
dependia sempre dos interesses que estavam em jogo. E tiveram que aprender a se
defender.
No
capítulo IX da segunda parte de sua obra, conta Inca Garcilaso de la Vega que,
não se fiando dos espanhóis, os incas
quando iam para a cidade pagar os tributos devidos, pediam que ele,
conhecedor dos “quipus” e da escrita latina, cotejasse as contas arroladas pelos colonizadores com os seus nós
e os seus fios.
Certamente, uma sábia prática
necessária que os colonizados – uma espécie que no Continente não se extinguiu
– jamais deveriam deixar de cultivar. Até porque, nesta América ao sul do rio
Bravo, os alienígenas nunca os deixaram de menosprezar ao impor suas enganosas
e perversas condições.
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