Menino de engenho,
já na quinquagésima edição da José Olympio do Rio de Janeiro, foi o primeiro
romance publicado por José Lins do Rego. Ele o queria, inicialmente, um livro
de memórias infantis – umas memórias que
fossem as de todos os meninos de engenho nordestinos – ou a biografia de
seu avô, expressão de patriarca rural do Nordeste. Mas, deu-se a vitória do
romancista sobre o memorialista, diz Antonio Carlos Villaça, no texto que
antecede o romance, na edição de 1994. E, Menino
de engenho, nos seus quarenta breves capítulos, não somente entusiasmou a
crítica de seu tempo como foi considerado obra geratriz de toda uma série de
romances que compõem o “ciclo da cana de açúcar”.E a história de uma infância ao redor da qual
gravita a vida rural, centrada na casa grande. Assim, embora o narrador fale
algo de sua vida – a morte violenta da mãe, a loucura do pai, a sua ida para o
engenho, as travessuras, os primeiros estudos, as iniciações ao amor – grande
parte dos capítulos registram o que acontece no dia a dia: as visitas feitas e
recebidas; as chuvas, enchendo o rio; as práticas religiosas e as crendices; as
andanças do senhor de engenho às suas terras; a aplicação da justiça.
´ E o retrato desse Brasil
nordestino se faz, sobretudo, pela prática dos homens. O capítulo 32 é, então,
exemplar. Trata da limpeza do eito, limpeza à enxada, por turmas, de uma
plantação, diz o glossário de Ivan Cavalcanti Proença. Uns oitenta homens,
comandados pelo feitor, trabalhando das seis da manhã até a boca da noite. Da calçada da casa-grande viam-se no meio do
canavial aquelas cabeças de chapéu de palha velho, subindo e descendo, no ritmo
do manejo da enxada. O almoço era
às dez horas: farinha seca com bacalhau. Comiam
na marmita de flandres, lambendo os
beiços como se estivessem em banquetes. Depois de quinze minutos de
descanso, pegavam no pesado outra vez. E a voz do senhor de engenho, dizendo
para o feitor: Que está fazendo esta
gente, seu José Felismino? Oitenta pessoas e o partido no mato? Nem eito de
mulher. Mas eles não se importavam com os gritos que eram os de todos os dias, fizessem eles muito ou fizessem pouco.

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