domingo, 14 de setembro de 1997

O anseio

           O livro tem por título Las piedras del cielo e foi publicado pela Losada de Buenos Aires, em 1970, um ano antes de ter recebido, Pablo Neruda, o Prêmio Nobel.

           É uma pequena obra feita de breves poemas que se inspiram em algo inusitado: as pedras. Fantasiosas, como as do primeiro poema, quando são pedras aladas, pedras que possuem voz, pedras que se transformam em pomba, em sino, em vento. Verdadeiras, aparecem em outros poemas e se constituem, então, pedra rolante, filha do vulcão, pedra dos caminhos, pedra polvorenta. Muitas e muitas vezes, motivo de achados estilísticos: Amêndoa azul, manancial de gotas prisioneiras, gota de fogo ou de orvalho.
           Sobretudo, a pedra é a matéria com a qual o poeta se relaciona afetivamente. Constata trajetórias, caminhos de transformação ao se referir à árvore calcinada que, o passar dos séculos faz tornar-se uma pedra; ao pedaço de vulcão desprendido da montanha que navega pelo rio e chega ao mar feito pureza.

          São versos que meditam sobre esse renovar constante da natureza com inesperadas imagens: Aquele mel, aquele tremer do mundo, / aquele trigo do céu / se elaboraram até se converter / em sol tranqüilo, em pálido topázio.

          Então, surgem as comparações entre os homens e as pedras.
          No poema XVII, os dois primeiros versos se constituem uma assertiva – Mas não atinge o homem a lição: a lição da pedra – da qual se irá originar um paralelo: a pedra feita do fogo, da água, da árvore, desperta como uma nova rosa endurecida; o homem, frágil podridão, veias jacentes, destruído.
          Daí, aparecer, por vezes, nos poemas que louvam as pedras (pedra pura, sol tranquilo, prodigioso testemunho, palavra muda da terra) um desejo de identificação traduzido nesse despertar no fundo das pedras, nesse querer estar junto delas, nesse antecipar anseios de voltar a ser mineral.
          É um querer aproximar-se de um ser perfeito, trabalhado pelo tempo e pelos mistérios da natureza que a natureza humana não lhe proporciona.
           Então depõe: Pedra fui: pedra escura / e foi violenta a separação, / uma ferida no meu alheio nascimento: quero voltar àquela certeza, / ao descanso central, à matriz / da pedra matéria / de onde não sei como, nem sei quando / me desprenderam para me desagregar.

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