Sic Transit
Diariamente,
eu
passo os cariocas para trás:
com
a mania de levar vantagem,
dão
sempre um passo a mais,desrespeitando
as
faixas e os pardais.
O
que lhes interessa não é bem
o
vermelho ou o verde que não vêem
e
sim o pole-position da largada,
o
charme da infração em cada esquina,
mas
só sai mesmo em disparada
se
ouve o toque de caça da buzina.
Tranquilo
e
obediente
eu saio sempre à frente
eu saio sempre à frente
vibrando
a lança
em
prol do estilo
Ensinou nos
Estados Unidos, Uruguai, França, Portugal e, atualmente é professor titular da
Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro. Autor de ensaios
(especialmente sobre Carlos Drummond de Andrade) e de poemas. Seu primeiro
livro data de 1955, publicado em Goiás, seu estado natal.
É Gilberto
Mendonça Telles de quem o Jornal de
Letras, Artes e Idéias, de Lisboa, no seu número 690, acaba de publicar
seis poemas inéditos: “Os pós modernos”, “Cantilena”, “Sic transit”, "Et tout
le rest”, “Sereia”, “Pescaria”.
A uni-los, um
tom de cotidiano e de troça ou esse finalizar um poema como Eça de Queirós
finalizava os seus capítulos: com uma comicidade inesperada. Um todo que se
envolve em lirismos, em aparência, simples e ingênuos.
Assim, são
trocistas os últimos versos de “Pescaria”: Mas
o grande problema, / o que me está infernizando, / o que me abrasa, / não é
fazer da vara algum poema / e sim como levar de contrabando / um rabo de sereia
para casa. Na verdade, talvez nem muito sérios sejam tampouco os primeiros
versos do poema a falar de varas de pescar um tanto quanto surrealistas.
Prosaico, esse poetar sobre o trânsito do Rio de Janeiro onde os cariocas, na
ânsia da desobediência às leis, submissos ao Charme da infração desrespeitam faixas e pardais. E, risível esse fazer-se de ouvidos moucos ou
esse meter algodão nos ouvidos para não se perder ou não ficar louco ao se dar
conta, nas lonjuras do cerrado, de algum
cochicho, de vozes de amor, de suspiros e gemidos; ou, esse anjo
sisudo que entra na contramão,
imagem com a qual se termina o poema “Cantilena”.
Porém, para
levar a sério, são muitos versos: os primeiros e os últimos de “Os pós
modernos”, estrofes de amor em que o sentimento se traduz em claros conceitos: não desistir jamais se o amor não cabe / na
forma absoluta ou sentindo que a beleza mais longínqua / é sempre devoluta.
Ou, aqueles em que às expressões populares (pó
de mico e seu fuxico, pó de traque e seu sotaque) às rimas fáceis (o resto é pluma, coisa nenhuma, fio e
fiapo, forma de trapo) se acrescentam inquietações daquele que se entrega
ao amor, do que sabe o dano que pode resultar em possuí-lo, de quem é
conhecedor do preço de viver.
Parecem esses inéditos serem feitos de uma poesia desobediente às prováveis leis do
poetar. Plena de improvisos e de imprevistos. De buscas e de descobertas.
Gilberto
Mendonça Telles é verdadeiro quando, versejando diz: eu saio sempre à frente / vibrando a lança / em prol do estilo.

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