Navegaciones y regresos, quarto volume das Odas elementales, foi publicado, pela
primeira vez, em 1959. É constituído de odes e de poemas que entre elas se
intercalam. Um todo, cuja temática, sabiamente, foi dito, é aquela das coisas
simples. Poderia parecer que nada é
mais chão do que uma cadeira, um prato, uma cama, um sino, uma âncora, um gato
ou um cão. Mas, a primeira palavra do poema, amo (intensificada pelo adjetivo louca e pelo advérbio loucamente),
estabelecendo uma inequívoca relação afetiva com os objetos cotidianos e
díspares que passam a ser enumerados – xícaras, sopeiras, chapéu, dedal,
pratos, esporas e outros tantos – os transformam em algo inesperadamente cheio
de luz e de vida.Algo que se enriquece quando Pablo Neruda fala de
sua ligação com as mãos do homem (Ai,
quantas / coisas puras / o homem / construiu) e com a lã, a madeira, o
cristal, as cordas, matéria que absorve a presença dos dedos que a trabalharam.
Pela terceira vez, inicia a
estrofe reiterando a expressão amo todas
as coisas. Torna a enumerar objetos – e algo de um momento vivido se
insinua – antes de, na estrofe seguinte, dizer desse prazer do toque, do olhar
que explicará, talvez, essa afinidade que teve com todas essas coisas que o
leva a confessar e foram para mim tão
existentes / que viveram comigo meia vida / e morrerão comigo meia morte.
Em “Ode às coisas”, o
lirismo surpreende como o de muitos outros poemas de Navegaciones y regresos por estar contido num sentir que, à
primeira vista, está muito distante daqueles grandes sentimentos que
tradicionalmente alimentam a poesia.O poeta usa um verbo, amar, cujo objeto – uma tesoura, um dedal, um leque – pode parecer,
de tal sentimento por ele expresso, indigno. No entanto, fruto de um trabalho,
a proximidade com o humano lhe dará um sentido maior que irá se completar na
estrofe seguinte quando é mencionado o companheirismo que, ao longo dos anos se
instaura entre o poeta e esses seres inanimados.
São palavras sem mistérios e
de uma voz que nelas entrelaça emoções, quem sabe inusuais, fazendo de “Ode às
coisas” um poema de despojada beleza.
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