domingo, 10 de novembro de 1996

E falando de "quitrín"

          É um breve livro encantador, escrito para fixar, ainda que em grandes traços, a história do “quitrin”, essa carruagem eminentemente cubana, indispensável em La Habana das primeiras décadas do século.


          O autor, Idelfonso Estrada y Zenea, que viveu entre 1826 e 1912, além de El quitrin, escreveu poemas e o romance El guajiro.A ele se deve, também,  a introdução dos jardins de infância em Cuba.
         
          El quitrin é construído em quatro partes: a primeira descreve detalhadamente a carruagem com suas imensas rodas e seu forro de diversas cores; na segunda e na terceira, também detalhadamente, aquele que o conduzia, o “calecero” particular e o de aluguel. E, na quarta parte intitulada “episódios”, narra aqueles relacionados com o “quitrin”: um nascimento, um assassinato, uma disparada do cavalo assustando seus viajantes, um padre e um sacristão. E o episódio que estaria perfeito para representar uma comédia de costumes se não fosse feito de pequenos dramas: trata do casal do interior que, enriquecido, se muda para a capital e nesse intuito de ostentação que tão bem caracteriza os novos ricos, acredita ser absolutamente necessária a posse de um “quitrin”. A carruagem é comprada e providenciados os cavalos e os homens para guiá-la. No dia em que seria estreada, porém, sucederam-se os incidentes e os acidentes e, embora cheio de jóias e de luxos e de boas intenções de ir à missa, a dona do “quitrin” teve de se resignar a voltar para casa sem ter ido a lugar algum.

          O texto de Idelfonso Estrada y Zenea, combinando o tragi-cômico com uma jocosa crítica de costumes, se constrói em dois tons. Um deles constituído de rápidas frases informativas que narram a ascenção social de Juana e Liborio e a sua ida para a cidade:

E vieram.
E compraram uma magnífica casa para viver.
E outras várias casas mais eles compraram.
E dom Libório se meteu a ser usurário.
E de tudo aproveitavam.
Mas não tinham “quitrin”.
E Juana disse a dom Liborio que era preciso ter “quitrin”.
E dom Liborio disse que sim.
E comprou o “quitrin”.
Mas, faltavam os cavalos [...]

          Num tom narrativo lento, mas igualmente corrosivo na descrição dos tipos e de suas ações, o texto que completa a história: como eles se vestem – e o casaco e bengala de punho de ouro, e sapatos novos de verniz, e lenço de cambraia encharcado em água de colonia e brincos de brilhante e pregador de ouro e anéis de valor nos dedos – e como agem em relação a seus escravos, parecendo deles ignorar a condição humana.

          E o pequeno livro que se propunha contar a história do “quitrin” e dizer como ele era, também fala de usos correntes na época. E de ambições, de vaidades e de ridículos. E dos pobres que disso tudo sofrem as conseqüências

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