Entre os mais belos poemas
de amor que Pablo Neruda selecionou para compor Todo el amor, publicado em 1971 pela Losada de Buenos Aires, figura
“Oda a un cine de pueblo”.
Um desses poemas em que
Pablo Neruda fixa um momento mágico de sua vida cuja ingenuidade aparente torna
mais forte um dizer pleno de sugestões.
Sem dúvida, nada mais
modestamente simples do que a primeira estrofe, Meu amor, / vamos ao cinema do povoado. Seguem-se os versos que dão conta do tempo – é noite e de bom
tempo, pois, se trata de uma noite
transparente de estrelas visíveis. Na mesma estrofe, outra vez, o tom prosaico
tu e eu entramos no cinema do povoado,
que se transforma com a informação de que é um cinema cheio de crianças e que
cheira a maçã. Nele, na sua tela já da
cor da pedra e da chuva, passam os velhos filmes: e a prisioneira, e os
cavalos, e os vaqueiros furando com seus tiros a perigosa lua do Arizona e a luta e a avalanche implumada / dos índios / abrindo seu espaço na planície.
Pablo Neruda se confessa com
a alma em suspense diante desses ciclões
de violência. E na estrofe seguinte – certamente o filme acabou e as luzes
se acendem – nota que muitos jovens do povoado, dormiram cansados do dia de
trabalho.
O poeta retorna, nos últimos
versos, ao vocativo inicial meu amor
já agora para traçar – usando o pronome nós – um caminho de participação
intensa. Um afã de viver plenamente, faremos
nossas, todas as vidas verdadeiras e de acreditar nos sonhos, em todos os sonhos. Na aventura do futuro,
na certeza de que será como deseja, envolve o ser amado, essa mulher que deseja
a seu lado, companheira.
A mulher que – diante
daqueles velhos filmes de “cow-boy”, fazedores de festa na matinés de domingo,
em que os altos e loiros, armados de armas de fogo eram sempre vencedores na
destruição dos escuros e toscos – possa, como ele, se emocionar e temer pelos
vencidos.Também, lastimar a perversidade das imagens, enfatizando um Bem
passível de se transformar em Mal, ao sul do rio Bravo, se o olhar que sobre
eles se pousam não estivessem a priori, obnubilados por conceitos falsos. A
mulher que saiba sonhar com ele um outro mundo para o Continente.
Em que desde crianças seus habitantes
já soubessem distinguir os verdadeiros heróis quando na luta brilhasse a lua do
Arizona.
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