Prometeu a máquina de
chover, os viveiros portáteis de animais de mesa, os azeites da felicidade que
fariam crescer legumes na caliça e pencas de amor-perfeito nas janelas. Gabriel
García Márquez
É um conto de amor de
Gabriel García Márquez, "Muerte constante más allá del amor",
publicado junto com outros seis em La
increíble y triste Historia de la cándida Eréndira y de su abuela desalmada
(Sudamericana, 1972)
Em troca de uma falsa
carteira de identidade que o pusesse a salvo da justiça, seu pai a enviou para
prestar favores ao Senador Onésimo Sánchez. Ele fora para Rosal del Virrey em
campanha eleitoral e ali, no mísero povoado, encontrara a mulher de sua vida.
Que não possuiu e morreu chorando por isso, porque, todo o tempo que estivera
com ela, seis meses e onze dias, quisera, apenas, tê-la perto para se salvar
da enorme e definitiva solidão em que se encontrava.
Era engenheiro metalúrgico
formado por universidade européia, casado com uma alemã e pai de cinco filhos.
Aos quarenta e dois anos estava condenado à morte por uma doença cujas dores,
somente com os artifícios dos remédios se acalmavam. Abraçado a Laura Farina,
cuja pele tinha a cor do petróleo cru e cujos olhos claros eram cheios de luz,
ele passou os últimos dias de sua vida.
Laura Farina vivia num
povoado nos confins de um deserto onde jamais havia crescido uma rosa.
Submete-se ao amor desse homem que nunca vira, como se submetera às ordens do
pai. E, apesar de ver a borboleta de papel revoltear muitas vezes antes de
ficar grudada na parede de onde a quer tirar, logo desiste diante das palavras
que lhe dizem ser impossível arrancá-la dali pois é só uma
pintura.Transformara-se a borboleta em pintura, como os pássaros de papel
jogados para o ar durante o comício tinham adquirido vida e voado para o mar.
Transformara-se o Senador ao abandonar uma vida inteira e o resto que lhe
faltava viver para se refugiar no amor proibido.
Metamorfoses que fogem da
lógica dos fatos, conduzindo o relato para um universo ambiguamente fantástico,
incrustado nesse outro que pareceria igualmente fantástico se não fosse tão
real. O universo de campanhas
eleitorais onde contracenam os descalços, os esquálidos com os que mantém o sistema
servindo-se das promessas de sempre. Os que assistem, sob um céu
escaldante, a consabida mesma farsa, pedindo não mais do que pequenas coisas; e
os que entendem muito bem o que diz o Senador a seus iguais: Os senhores e eu sabemos que no dia em que haja árvores e flores nesta
latrina de bodes, no dia em que haja sáveis em vez de vermes nos poços nem os
senhores e nem eu já teremos o que fazer aqui. Estou sendo claro?
Na praça, enquanto o
discurso promete grandezas e felicidade, é armado um cenário de árvores verdes
e de casas de tijolos com janelas de vidro que escondem os miseráveis ranchos
da vida real. É para esse mundo de ilusão que o gesto do Senador aponta, ao
terminar seu discurso de otimismo. Mas só ele percebe que a força de ser
montado e desmontado também esse mundo estava se deteriorando. Os índios de aluguel
que levava com ele para ajudar a aplaudir e os que o escutavam pouco sabiam
distinguir.
E de acreditar em promessas,
ninguém nunca está a salvo.

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