domingo, 15 de janeiro de 1995

Glória passageira


          Em 1949, Alejo Carpentier publicou El reino de este mundo, relato de feitos extraordinários acontecidos no Haiti entre 1760 e 1820 quando ocorreu a insurreição dos escravos, a abolição da escravatura e o fim do império do rei Henri Christophe.Eleito presidente da República pela Assembléia Constituinte, cinco anos depois, se proclamou rei e assim governou parte do país até 1820 quando se suicidou.

          Intitulara-se Henrique I e quisera repetir no seu país de ex escravos, uma corte francesa. Uma corte onde os uniformes dos oficiais tinham mais pompa do que os usados pelos oficiais de Napoleão; onde o palácio, em tons rosados e com janelas arqueadas, era rodeado de terraços, estátuas, arcadas, jardins, pérgolas, arroios artificiais; onde as mulheres se enfeitavam com plumas e usavam os vestidos de cintura alta prescritos na corte francesa.

          Mas, onde os trabalhadores negros serviam sob o látego de guardas negros, tão escravos e maltratados como no tempo em que os brancos eram os donos do Haiti: crianças, mulheres e velhos trabalhavam, como formigas, na construção de um castelo fortificado, sem direito ao descanso.

          O rei negro que pretendeu fundar uma dinastia, fazia de seu povo o que os brancos haviam feito nas outrora férteis plantações de açúcar: peças de uma engrenagem para produzir riquezas.

          Esquecendo suas origens, adotara a língua dos que no passado haviam explorado a ilha e os homens. Assim como adotara seus gostos e costumes.  Usava casaca cheia de condecorações, assistia missa, pagava uma governanta branca para educar suas filhas e se rodeava dos mais diversos objetos europeus trazidos para a ilha.

          Na sua ambição, fora além de todos os monarcas franceses. A fortaleza que ordenou construir, ignorando o sofrimento e as vidas que se perdiam para erguer-lhe os muros, de nada lhe valeu. Pretendendo-se um reformador apenas se serviu de crenças e rituais alheios que não o defenderam da fúria dos humilhados.

          Esses que pensava abandonar à própria sorte quando no alto da Cidadela em construção mensurava todo o seu poder, acreditando que a eles só restaria levantar os olhos para a fortaleza cheia de milho, de pólvora, de ferro e de ouro...   As injustiças e a miséria, porém, os tiraram da submissão quando não mais se resignaram a somente contemplar a riqueza dos outros.

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