domingo, 8 de janeiro de 1995

A pompa

 
          Os homens já estavam no porto esperando a partida para a América, abandonados pelos capitães, presa das dúvidas e das incertezas.  Foram muitos dias de espera cheios do medo por esse futuro indecifrável que os aguardava. As naves partiriam da Espanha em busca de especiarias e duzentos e trinta e sete homens esperavam a partida. E, antes dela, esperavam pelos capitães das naves.    E eles chegaram anunciados por uma densa nuvem de pó, as armaduras brilhando ao sol. Ao sol forte do sul da Espanha, com as pesadas armas nos ombros, as mãos em fogo, os pés doendo os homens esperam e, finalmente, os vêem chegar nessa usual exibição de pompa dos dominadores.

          E chega o capitão Fernando de Magalhães igual a um Deus. Suas armas que reverberam e a capa de veludo verde que cobre suas costas e as ancas de sua cavalgadura lhe dão um aspecto sobrenatural, inumano. E chega entre veludos e ouros, o intendente da esquadra, vestido de camisa de renda.

          Mostram-se os escudos. Os pendões e as lanças se agitam. Há ruídos de ferros e um murmúrio de sedas. Há estrépito de cascos.

          Apenas um gesto com a mão enluvada do capitão é suficiente para indicar o rumo e ele passa, arrogante, entre os homens que o irão obedecer.

          Completado o tempo de espera, os barcos se põem a navegar no dia 20 de setembro de 1519, para a conquista do mar até as árvores da canela.

          Napoleón Baccino Ponce de León, no seu romance Maluco (Prêmio Casa de Las Américas, 1989) relata essa epopéia iniciada na espera do porto e prolongada por mares e terras jamais vistos.

          Da fome e do frio, do medo, das desilusões, muitas vezes da morte se livraram os doze homens que não resistiram à angústia da espera no porto e desertaram.

          Os outros, que presenciaram a chegada dos capitães com seus movimentos de ferros e ouropéis e não encontraram forças para desistir tiveram o destino dos que se submetem à voz de mando.

          A voz de mando que para ser melhor obedecida, serve-se, também, de rituais e da pompa que parecem ser ainda mais eficientes para convencer os homens do que a lógica e a razão.

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