Quando morreu em 24 de
setembro de 1973, Pablo Neruda deixou oito livros inéditos. Segundo a Editora
Losada eram poemas escritos simultaneamente mas que deveriam ter uma ordem
determinada de aparição, estabelecida pelo próprio poeta: La rosa separada, Jardin de
invierno, 2000, El corazón amarillo, Libro de las preguntas, Elegia, El mar y las campanas, Defectos
escogidos.
Os últimos poemas que
escreveu estão contidos em El mar y las
campanas cuja primeira edição é de 28 de novembro de 1973 isto é, dois
meses depois de sua morte. São em número de quarenta e nove e muitos deles
ficaram sem nome. Mas, no livro, para facilitar a sua identificação, recebem o
primeiro verso ou parte dele, como título, colocado entre colchetes.
O mar, e os desacertos do
século, uma falta de esperança, velhas preocupações renovadas são antigos motivos
desses poemas. Alguns, germinam de um ou outro momento fugidio: a lembrança de
um rio na sua nascente, a visita de desconhecidos na sua casa em Isla Negra,
esse ramo de acácia-mimosa que dourado, lhe ilumina a viagem por estradas de névoa
e de terras desertas no crepúsculo
desabitado.
Outros, nascem de imagens do
passado. A rua em que viveu quando jovem e que talvez não mais exista ou essa
outra em que preso aos versos sonhava com jardins parisinos de parques frios e estátuas impecáveis.
Muitos, se enraízam na
amargura que só o ter vivido permite conhecer: a solidão entre os outros, feita
de silêncios, a constatação de que algo se perdeu para sempre, a
inexorabilidade da morte - Porque é obrigatório
obedecer ao inverno [...] - na
qual estão contidas a solidão e o emudecer.
Poemas de amor, três. E os
três para Matilde.
O primeiro, relembra um
momento áspero de sua vida: Quando eu
decidi me tornar claro / e procurar a mão da desdita que é o mesmo em que encontra a mulher, que a partir de
então, o irá acompanhar.
Na segunda estrofe a nomina
e também a Chillán, o lugar onde se encontraram. Então, enumera o bem que dela
recebe, todos os dias e todas as noites, sempre: o amor na pele que se entrega,
ao abrir de todas as janelas do mar, para que voe a palavra escrita.
Cotidiano que se reafirma no
título do segundo poema “Cada dia Matilde”. Nele, as expressões amorosas
lembram àquelas de Los versos del
capitán. Mas, se algo da natureza entrelaçado à figura feminina permanece
nesses versos, outros elementos indicadores da passagem do tempo se
acrescentam: em cada ramo guardas
testemunho / de nossas indeléveis primaveras.
Reafirma-se a plenitude de uma presença que delicada
como uma flor de anís continua sendo para o poeta uma fonte de vida.
Mas é no terceiro poema que
se inscreve a homenagem maior à Matilde. Tem por título a palavra “Final”. E
Pablo Neruda, assim o afirma a Editorial Losada, o concluiu pouco antes de
morrer. Matildeӎ a palavra que o inicia. Um vocativo antecedendo esses
versos que sintetizam o calvário do enfermo entre a febre e a dor. A eles se
seguem os que dão testemunho da constante presença consoladora da mulher que
ama: o mundo é mais azul e mais terrestre
/ de noite, quando durmo / enorme, dentro de tuas breves mãos.
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